MÚSICA E LÁGRIMAS (The Glenn Miller story, 1954, Universal Studios, 115min) Direção: Anthony Mann. Roteiro: Valentine Davies, Oscar Brodney. Fotografia: William Daniels. Montagem: Russell Schoengarth. Figurino: Jay Morley Jr.. Direção de arte/cenários: Alexander Golitzen, Bernard Herzbrun/Russell A. Gausman, Julia Heron. Produção: Aaron Rosenberg. Elenco: James Stewart, June Allyson, Harry Morgan, Charles Drake, George Tobias. Estreia: 17/02/54
3 indicações ao Oscar: Roteiro Original, Trilha Sonora Original (Musical), Som
Vencedor do Oscar de Melhor Som
No período compreendido entre 1939 e 1942, não existia no mundo orquestra mais famosa do que a liderada por Glenn Miller: campeão de vendas de discos e com uma agenda de apresentações quase desumana, o músico norte-americano que mudou a forma como o público ouvia (e reagia) às músicas que embalavam bailes por todo o planeta. Dono de um estilo único e moderno, Miller surpreendeu aos fãs quando, no auge do sucesso, em 1941, resolveu deixar tudo de lado e alistar-se para lutar pelos EUA na II Guerra Mundial. Seus planos não eram pouco ambiciosos: ele sabia que, dentre os jovens soldados norte-americanos, havia muitos talentos à espera de serem descobertos e que dariam qualquer coisa para trocar suas baionetas por instrumentos musicais. Depois de convencer o Exército a lhe conferir a patente de Capitão apesar de nunca ter tido contato com qualquer serviço militar, Miller passou a recrutar os novos membros de sua orquestra de pelotão em pelotão, até formar um grupo de quase cinquenta profissionais - que iam de soldados a sargentos - em uma orquestra que tinha por objetivo entreter as tropas aliadas pela Europa. Já como major, ele levou diversão à milhares de conterrâneos pelos anos em que esteve à frente de seu novo grupo, mas em dezembro de 1944, embarcou em um voo de Londres a Paris - e simplesmente desapareceu. Seu monomotor simplesmente parece ter-se dissipado no ar, em um dos maiores mistérios da história da aviação - nem mesmo várias versões surgidas nas décadas seguintes deram conta de por um ponto final na questão.
Mas se a trágica e inexplicada morte de Miller ainda hoje intriga fãs e historiadores, ela é apenas um detalhe em "Música e lágrimas", lançado pouco menos de dez anos após seu desaparecimento e que se dedica, com quase veneração e sem espaço para polêmicas, a contar sua trajetória como músico e pai de família. Com aprovação da viúva do músico, Helen, o roteiro do filme de Anthony Mann ignora o gênio difícil de Miller e, na pele do dócil e respeitabilíssimo James Stewart, o protagonista chega ao público com uma imagem intocada e bem mais apropriada ao que desejava a plateia dos anos 50, ainda traumatizada com seu destino inesperado. Dirigida por Anthony Mann ( que ficaria conhecido pelo épico "El Cid", realizado quase uma década mais tarde), a cinebiografia de Glenn Miller foi muito bem recebida pela crítica e pelo público justamente por resgatar a memória afetiva de um de seus maiores ídolos, mas à luz do tempo, pode-se dizer que, apesar de correto, o filme de Mann não resiste tão bem ao tempo: é açucarado em excesso, e não oferece mais do que uma visão simplista e unilateral de seu personagem principal.
Premiado com o Oscar de melhor som - nada mais apropriado para um filme que tem a música como sua base e principal ingrediente - "Música e lágrimas" acompanha a história de Miller a partir do momento em que ele ingressa na banda de Ben Pollack, impressionado com um de seus arranjos, e de seu reencontro com uma uma antiga namorada, Helen Berger (June Allyson) - com quem virá a se casar depois de dois anos tentando encontrar o ritmo perfeito para a criação de sua própria orquestra. O roteiro (também indicado ao Oscar) não faz questão de aprofundar o desenho de seus protagonistas, optando, ao invés disso, em acompanhar a escalada do compositor rumo ao topo das paradas de sucesso e da aclamação popular. Emoldurando suas cenas com uma trilha sonora recheada de hits de Miller (é lógico), Mann constrói uma narrativa sem sobressaltos, mas tampouco sem maiores emoções: sua obra é morna, ainda que agradável; elegante, ainda que sem brilho; didática, ainda que superficial. Stewart está bem como Glenn Miller, mesmo que sua visão do personagem esteja um tanto distante da real personalidade do músico (culpa do roteiro chapa branca e sem ousadias). June Allyson, por sua vez, faz o que pode com uma personagem que pouco faz em cena a não ser apoiar o marido incondicionalmente e lhe servir de inspiração ocasional - o poder da verdadeira Helen era tanto sobre o projeto que até mesmo o mais popular e importante membro da orquestra de seu marido, Tex Beneke, ficou de fora de sua versão da história, porque eles estavam brigados na ocasião da realização do filme.
"Música e lágrimas" é um filme para fãs. Fãs de Glenn Miller, de James Stewart, de boa música e de filmes clássicos. Está longe de ser uma obra-prima ou até mesmo um filme imperdível, mas agrada a quem não se cansa de ouvir "In the mood" ou "Moonlight serenade" como forma de sublinhar um romantismo nostálgico e há muito perdido. E o fato de que a história de Miller ter acabado de forma tão intrigante - a teoria de que seu monomotor foi abatido por engano por um avião aliado que estava se livrando de bombas não utilizadas, para pousar mais leve, acabou sendo jogada por terra logo que surgiu - apenas torna seu caminho ainda mais interessante. Pena que faltou coragem e mais criatividade (algo que nunca lhe faltou) ao filme que lhe fez uma justa homenagem.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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