NOSSAS NOITES (Our souls at night, 2017, Netflix, 103min) Direção: Ritesh Batra. Roteiro: Scott Neustadter, Michael H. Weber, romance de Kent Haruf. Fotografia: Stephen Goldblatt. Montagem: John F. Lyons. Música: Elliot Goldenthal. Figurino: Wendy Chuck. Direção de arte/cenários: Jane Ann Stewart/Helen Britten. Produção executiva: Pauline Fischer, Ben Ormand. Produção: Finola Dwyer, Robert Redford, Erin Simms. Elenco: Jane Fonda, Robert Redford, Matthias Schoenaerts, Judy Greer, Bruce Dern, Phyllis Sommerville, Iain Armitage. Estreia: 01/9/2017 (Festival de Veneza)
O primeiro encontro profissional entre Jane Fonda e Robert Redford se deu em 1966, no filme "Caçada humana", dirigido por Arthur Penn e estrelado por Marlon Brando. No ano seguinte, estrelaram, no auge da beleza e da juventude, a comédia romântica "Descalços no parque", baseada em peça teatral de Neil Simon. Uma terceira parceria veio em 1979 com "O cavaleiro elétrico", dirigido por Sydney Pollack, e demorou quase quatro décadas para que uma nova colaboração chegasse até os fãs da dupla. Produzido pela Netflix, o drama romântico "Nossas noites" estreou no Festival de Veneza de 2017 e, se não fez o barulho que se poderia esperar de tal reunião isso se deve mais à despretensão do filme do que por sua possível falta de qualidades. Delicada e sensível, a adaptação do livro de Kent Haruf é um presente para um público em busca de histórias simples e bem contadas, com personagens com as quais é fácil se identificar de alguma maneira. E é claro que contar com a ajuda de Fonda e Redford não atrapalha em nada. Mesmo que não acrescente nada ao gênero e faça pouco pela carreira dos envolvidos, pode-se dizer, sem medo, que "Nossas noites" é um filme para aquecer o coração.
Sem medo de demonstrar a idade, Fonda e Redford são a principal fonte de interesse no filme dirigido pelo indiano Ritesh Batra, que ficou conhecido no Ocidente graças ao simpático "The lunchbox" (2013). Inteligente, Batra acerta em cheio a não tentar dissimular o tom quase melodramático da história e assumir seu dom para o romantismo exarcebado - ainda que pincelado com tons realistas e modernos. Fonda vive Addie Moore, uma viúva que, tentando amenizar a solidão, bate à porta de seu vizinho, Louis Waters (Redford), também viúvo, e faz a ele uma proposta inusitada: já que se conhecem há anos, ainda que superficialmente, por que não tentam dormir juntos na casa dela, como forma de fazer companhia um ao outro? A proposta é clara: não é sexo que Addie está procurando, e sim uma forma de conexão humana. Sem nada a perder, Louis aceita a nova amizade e os dois, aos poucos, começam a criar uma intimidade - ela ainda sofre com a morte precoce da filha, ainda criança, e ele tenta lidar com o sentimento de culpa de ter traído a esposa quando a filha ainda era pequena. Conforme vão se tornando mais próximos, porém, Abbie e Louis passam a ser o assunto da vizinhança - e não demoram a perceber que um sentimento muito forte está nascendo entre eles.
Como não poderia deixar de acontecer, no entanto, a felicidade do novo casal começa a incomodar, principalmente a Gene (Matthias Schoenaerts), filho de Abbie e ex-aluno de Louis: com o casamento em crise, Gene procura a mãe para pedir que ela fique um tempo com seu filho, Jamie (Iain Armitage), até que ele resolva sua vida. A presença do menino, ao contrário de afastá-la de seu novo amigo, faz com que Abbie o valorize ainda mais: juntos, os três formam uma nova e unida família, onde o respeito, o amor e o carinho são parte crucial da equação. Mas será que sua coragem em investir em um novo amor depois dos setenta anos valerá a pena? Ou os problemas do passado serão mais fortes que a busca pela felicidade já no outono da vida? O roteiro, escrito pelos mesmos Scott Neustadter e Michael H. Weber da comédia romântica "(500) dias com ela" (2009), não se aprofunda em tais questões, que surgem conforme a relação entre os protagonistas vai se tornando cada vez mais sincera. Assim como na vida, os problemas aparecem em cada esquina (e de tamanhos variados) e precisam ser resolvidos antes dos próximos passos, e os personagens lidam com eles sem grandes cenas dramáticas ou lágrimas desnecessárias. "Nossas noites" é um filme de pequenos momentos, de sentimentos reais e personagens que podem morar ao lado do espectador. Para uns é uma qualidade, para outros pode ser entediante.
A química entre Robert Redford - um dos produtores do filme - e Jane Fonda é preciosa. Despidos do glamour de estrelas de cinema, ambos entregam atuações comoventes, que envolvem o público sem fazer muito esforço. Apesar do início um tanto estranho - a proposta de Addie não é exatamente algo comum - e de certa demora em estabelecer obstáculos à nascente história de amor, "Nossas noites" entrega à audiência um produto com muito mais conteúdo do que boa parte de seus congêneres, normalmente dedicados à romances entre jovens fotogênicos em cenários paradisíacos. Addie e Louis vivem em uma cidadezinha do Colorado sem maiores atrativos e há muito não podem ser considerados símbolos sexuais, mas a história do escritor Kent Haruf, que morreu seis meses antes da publicação de seu livro - ressoa em qualquer lugar do mundo justamente por sua humanidade franca e honesta. Dirigido com sutileza e interpretado por dois dos maiores nomes do cinema hollywoodiano, "Nossas noites"" vale a pena. É como um chocolate quente no auge do inverno.
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