UM LUGAR SILENCIOSO (A quiet place, 2018, Paramount Pictures, 90min) Direção: John Krasinski. Roteiro: John Krasinski, Bryan Woods, Scott Beck, história de Bryan Woods, Scott Beck. Fotografia: Charlotte Bruus Christensen. Montagem: Christopher Tellefsen. Música: Marco Beltrami. Figurino: Kasia Walicka-Maimone. Direção de arte/cenários: Jeffrey Beecroft/Heather Loeffler. Produção executiva: Scott Beck, Celia Costas, Aaron Janus, John Krasinski, Allyson Seeger, Bryan Woods. Produção: Michael Bay, Andrew Form, Brad Fuller. Elenco: Emily Blunt, John Krasinski, Millicent Simmonds, Noah Jupe, Cade Woodward, Leon Russom. Estreia: 09/3/2018 (South by Southwest Film Festival)
Indicado ao Oscar de Edição de Som
Depois de penar por um bom tempo resumido a produções direcionadas a um público menos exigente e formado em grande parte por adolescentes que se satisfaziam em assistir a assassinos mascarados chacinando suas vítimas sem a menor sutileza, o cinema de terror em Hollywood parece ter encontrado um caminho para atingir os espectadores mais maduros. Cineastas como Jordan Peele - de "Corra" (2017) e "Nós" (2019) - e Ari Aster - de "Hereditário" (2018) e "Midsommar" (2019) - se tornaram os principais nomes de uma espécie de renascimento do gênero, que passou a atingir então as críticas positivas que raramente conquistava - Peele chegou até mesmo a levar um Oscar de roteiro original por "Corra!", que também foi indicado aos prêmios de filme, ator e direção. Respeitados como há muito não conseguiam ser, os novos filmes de terror norte-americanos não deixaram de ser, no entanto, bastante bem-sucedidos. Um exemplo claro desse novo painel é "Um lugar silencioso", uma produção barata (custou cerca de 17 milhões de dólares, o que não paga sequer o cachê de uma grande estrela) que rendeu surpreendentes 340 milhões ao redor do mundo - e imediatamente tornou-se um dos filmes mais populares da temporada, com direito a duas sequências ainda inéditas. Tudo graças à união certeira de um bom roteiro, atuações acima da média, uma tensão palpável e uma direção inspirada do também ator (e corroteirista) John Krasinski.
Sim, Krasinski é mais conhecido do público como o adorável Jim Halpert da versão ianque da série "The office", e como o agente Jack Ryan da adaptação televisiva dos livros de John LeCarré, mas "Um lugar silencioso" não é seu primeiro trabalho na direção. Seus dois primeiros filmes, a comédia dramática "A família Hollar" (2016) e ""Brief interviews with hideous men" (2009), ficaram inéditos no Brasil e tampouco fizeram barulho nos EUA. Seu contato com o material que se tornaria "Um lugar silencioso" começou com um convite feito pelos produtores para que ele assumisse o papel principal do filme, depois que o roteiro de Scott Beck e Bryan Woods livrou-se da possibilidade de ser incorporado a um capítulo da série "Cloverfield": animado com a trama, Krasinski mudou de ideia e acabou não apenas aceitando trabalhar como ator, mas também como diretor e corroteirista. Além disso, escalou para o papel da protagonista feminina, sua mulher, a excelente Emily Blunt, também encantada com o roteiro - e, ao contrário de simples nepotismo, foi uma escolha mais do que acertada: Blunt entrega uma atuação visceral, premiada com uma estatueta do SAG Awards.
A trama de "Um lugar silencioso" é daquelas fáceis de resumir em uma única frase: família tenta sobreviver ao ataque de monstros violentos que encontram suas vítimas através do sons que elas fazem. Porém, por trás desse enredo aparentemente simples, o filme é uma pérola do gênero. Calcada basicamente na química do elenco, do desenho de som inteligente (única indicação ao Oscar do filme) e da direção firme de Krasinski, que mantém o ritmo até os minutos finais, a produção envolve o espectador desde seu começo, dando a ele a chance de ir descobrindo aos poucos todos os detalhes da situação em que estão os Abbott. Vagando por uma cidade fantasma e impedidos de fazer qualquer tipo de ruído, eles são apresentados sem passado: o que interessa ao roteiro é como eles estão e como farão para manter-se salvos de uma situação para a qual não tinham nenhuma experiência. Imersivo ao máximo - o primeiro (e rápido) diálogo falado acontece aos 38 minutos -, o filme mergulha o público em uma viagem de tensão e suspense como poucas produções recentes de terror. Evitando a violência gráfica ou o excesso de clichês, a trama é conduzida com sutileza ímpar, que não deixa de infligir medo na plateia - especialmente quando demonstra, desde seu princípio, que ninguém está completamente a salvo.
Krasinski demonstra que, mesmo sem experiência em filmes de terror, compreende perfeitamente as engrenagens do gênero, entregando cenas que deixam o público em um silêncio tão completo quanto o dos personagens da tela. Elementos simples, como um prego na escada e um brinquedo eletrônico, colaboram para sublinhar o tom nervoso e arrebatador da produção que tem ao menos uma cena já antológica, em que Evelyn (vivida com intensidade por Blunt) é obrigada a dar à luz, sozinha, sem emitir um único gemido: é muito provável que a plateia, completamente seduzida pela proposta do filme, esteja também em silêncio absoluto - fato que, em exibições-teste, assustou os exibidores que não entendiam que também os espectadores, hipnotizados pela história, deixavam a pipoca e o refrigerante de lado para não fazer o barulho que poderia acabar com a vida dos personagens. Nada mais apropriado para um filme de terror que, sem apelar para a violência explícita, encontrou de cara seu lugar no coração dos fãs do gênero - e que já tem duas continuações confirmadas (uma delas, já pronta, teve o lançamento adiado por causa da pandemia de Coronavírus). É esperar para ver se os próximos capítulos serão tão gratificantes.
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