ACONTECEU EM WOODSTOCK (Taking Woodstock, 2009, Focus Features, 120min) Direção: Ang Lee. Roteiro: James Schamus, livro de Elliot Tiber, Tom Monte. Fotografia: Eric Gautier. Montagem: Tim Squyres. Música: Danny Elfman. Figurino: Joseph G. Aulisi. Direção de arte/cenários: David Gropman/Ellen Christiansen De Jonge. Produção executiva: Michael Hausman. Produção: Celia Costas, Ang Lee, James Schamus. Elenco: Demetri Martin, Emile Hirsch, Imelda Staunton, Henry Goodman, Jonathan Groff, Jeffrey Dean Morgan, Mamie Gummer, Eugene Levy, Dan Fogler, Andy Prosky, Skylar Astin, Paul Dano. Estreia: 16/5/2009 (Festival de Cannes)
As lendas e fatos a respeito do Festival de Woodstock todo mundo já conhece - seus números, seus artistas, seus imprevistos e principalmente seu legado à história da música e da cultura popular (sem falar nos desdobramentos sociais e políticos). O que, então, poderia haver de novo a ser explorado em um filme quarenta anos depois do evento? A resposta surgiu quando o diretor Ang Lee foi interpelado por Elliot Tiber durante a divulgação de seu "Desejo e perigo" (2007): autor de um livro sobre os bastidores da organização do festival, do qual foi parte crucial, Tiber ofereceu ao cineasta a chance de contar a história sob um novo ponto de vista - e com um viés mais humano, comum em sua obra. Com seus colaboradores de confiança (James Schamus no roteiro, Eric Gautier na direção de fotografia e Tim Squyres na edição), o já vencedor de um Oscar (por "O segredo de Brokeback Mountain") lançou, no Festival de Cannes de 2009 o esperado "Aconteceu em Woodstock". O resultado, porém, ficou aquém das expectativas - tanto em termos financeiros quanto artísticos - e acabou se tornando um dos trabalhos menos memoráveis de Lee, a despeito de suas notáveis qualidades
Elliot Tiber, o autor do livro que deu origem ao filme, é interpretado por Demetri Martin, comediante em seu primeiro trabalho no cinema - uma falta de experiência e carisma que atrapalha muito as possibilidades de conexão com o espectador. Em 1969, Tiber abandona uma carreira pouco feliz de design de interiores em Nova York e retorna para a pequena cidade de White Lake com o objetivo de ajudar seus pais (Henry Goodman e Imelda Staunton) a manter vivo seu pequeno e nada convidativo hotel. A missão é complicada, já que nenhum dos dois é exatamente competente nos negócios e nada no lugar chama a atenção dos turistas ocasionais. A salvação da lavoura surge, no entanto, quanto ele menos espera: ao saber que uma cidade vizinha voltou atrás ao permitir a realização de um festival de música para o público hippie, o jovem toma as rédeas da situação e, depois de fazer contato com os produtores, transforma seu pacato lugarejo no cenário de um dos mais importantes acontecimentos culturais da história. Para isso, porém, ele precisa lutar contra o preconceito local, os problemas logísticos que envolvem a realização de algo inesperadamente gigantesco e encarar sua própria sexualidade conflituosa.
Fugindo da tentação de fazer do festival seu protagonista, Ang Lee segue mantendo-se fiel à sua marcante característica de priorizar os sentimentos humanos e, com eles, criar um amplo mosaico de personagens interessantes, como a travesti interpretada por Liev Schreiber (que assume o posto de segurança informal do evento), o jovem veterano do Vietnã vivido por Emile Hirsch e a idiossincrática mãe do protagonista (em um show particular de Imelda Staunton). Woodstock, na visão do cineasta, é apenas o pano de fundo (forte) para uma jornada de autodescobrimento, pincelada de momentos clássicos reproduzidos sutilmente pelo desenho de produção caprichado e pelo figurino, que dialogam com o tom onírico impresso pelo roteiro. A opção do filme em não mostrar absolutamente nenhum número musical - o que provavelmente é motivo de frustração para os fãs mais obcecados do festival - é surpreendente, mas condiz com o tom menos documental e mais emotivo da produção, que apesar disso falha em não aprofundar a contento todas as possibilidades que apresenta ao espectador. Tal problema impede que uma de suas maiores qualidades - o belo elenco - seja aproveitado em todo o seu potencial.
Quem começar uma sessão de "Aconteceu em Woodstock" com a intenção de ver Janis Joplin, Joe Cocker ou Jimi Hendrix certamente irá se decepcionar. O filme de Ang Lee é para um público que procura obras sobre pessoas em busca de si mesmas - mesmo que para isso seja preciso fazer parte de um evento de proporções gigantescas que mudou o mundo (ou ao menos a concepção de muita gente sobre ele). Pode não ser uma obra-prima como alguns dos melhores trabalhos do cineasta, mas é simpático e honesto o bastante para não fazer feio em uma filmografia marcada pela sensibilidade e pelo carinho por seus personagens.
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