terça-feira

AMISTAD

AMISTAD (Amistad, 1997, Dreamworks SKG, 155min) Direção: Steven Spielberg. Roteiro: David Franzoni. Fotografia: Janusz Kaminski. Montagem: Michael Kahn. Música: John Williams. Figurino: Ruth E. Carter. Direção de arte/cenários: Rick Carter/Rosemary Brandenburg. Produção executiva: Laurie MacDonald, Walter Parkes. Produção: Debbie Allen, Steven Spielberg, Colin Wilson. Elenco: Matthew McConaughey, Morgan Freeman, Djimon Hounson, Anthony Hopkins, Nigel Hawthorne, David Paymer, Pete Postletwhaite, Stellan Skarsgard, Anna Paquin, Paul Guilfoyle, Xander Berkeley, Arliss Howard. Estreia: 04/12/97

4 indicações ao Oscar: Ator Coadjuvante (Anthony Hopkins), Fotografia, Trilha Sonora Original/Drama, Figurino

Chega a ser inacreditável que o diretor de "Amistad" seja o mesmo Steven Spielberg que assinou filmes como "Os caçadores da Arca Perdida" e "ET, o extra-terrestre", filmes que, apesar de escapistas e estritamente comerciais, tinham a noção exata de ritmo. Arrastado, monotóno e em muitos momentos simplesmente desinteressante, o longa de Spielberg é uma prova cabal de que até mesmo os aparentemente infalíveis tem seus momentos equivocados.

Feito com a intenção de abocanhar uma penca de Oscar - objetivo que Spielberg nunca deixou de lado mesmo depois do sucesso de "A lista de Schindler" - "Amistad" decepcionou tanto aqueles que esperavam mais uma obra-prima do cineasta quanto os fãs de dramas épicos históricos, uma vez que não atinge o mesmo nível emocional de seus melhores filmes. Inspirado em uma história real - retratada no livro "Echo of lions", cuja autora Barbara Chase-Riboud moveu um processo contra os produtores - é um filme que tinha um enorme potencial, mas que ficou muito aquém de suas possibilidades. Culpa da opção de Spielberg em concentrar-se nas maquinações políticas da trama ao invés de seguir seu habitual caminho de comover o público.

A sequência inicial é poderosa e impressiona pelo cuidado visual (cortesia da belíssima fotografia de Janusz Kaminski e pela forte trilha sonora de John Williams): o ano é 1839 e o navio Amistad, indo de Cuba em direção aos EUA vê sua carga (escravos negros viajando para serem vendidos) iniciar uma violenta rebelião. Liderados por Cinque (Djimon Houson) - que deixou em sua terra natal uma história de crueldade e sofrimento contra sua família - os negros matam a maior parte da tripulação e exigem dos sobreviventes que os levem de volta para casa. Enganados, eles acabam aportando nos EUA, onde são presos acusados de assassinato. Sem falar uma palavra de inglês, eles vem seu caso ser assumido pelo advogado abolicionista Roger Sherman Baldwin (Matthew McConaughey). Aos poucos o caso ganha contornos outros - com vários países alegando a propriedade dos réus - e sofre uma reviravolta com a adesão do ex-presidente John Quincy Adams (Anthony Hopkins), também um fervoroso político anti-escravagista.



Tecnicamente "Amistad" é admirável como qualquer produto com a griffe de Spielberg. Da fotografia espetacular (que vai do escuro claustrofóbico às explosivas cores libertárias) à reconstituição de época detalhista, tudo é de encher os olhos. O elenco super estelar que desfila pela tela também chama a atenção pela diversidade: estão presentes desde veteranos consagrados como Anthony Hopkins (que concorreu ao Oscar por sua pequena participação) e Morgan Freeman até jovens promessas, como é o caso de Matthew McConaughey e de Djimon Houson (modelo sul-africano que ficou com o papel recusado por Denzel Washington e Cuba Gooding Jr. e que impressiona pela expressividade corporal). A trilha sonora de John Williams mais uma vez é adequada e delicada. Mas falta o essencial ao filme: coração.

É difícil de entender como Spielberg - que tem no currículo o sensível "A cor púrpura", que também toca na ferida do racismo - errou tanto a mão em "Amistad". Nem mesmo as cenas com mais potencial dramático (o passado de Cinque e a maneira cruel com que a tripulação tratava os escravos) conseguem emocionar a plateia, sedenta por boas cenas de impacto. Mesmo quando a plateia consegue ser arrebatada, a sensação é tão efêmera que não justifica duas horas e meia de duração. Isso sem falar em longas cenas em que as personagens discutem política americana do século XIX, que, mais do que interesse, desperta somente sono.

Em resumo, "Amistad" é um filme lindamente fotografado, com uma trama socialmente importante, realizado com todos os recursos milionários de Hollywood. Mas lhe falta o essencial: alma. E em um filme que fala sobre um tema tão caro quanto liberdade, isso é um pecado mortal.

4 comentários:

renatocinema disse...

Acho que vi no dia errado. Vi, não gostei. Mas, sei que preciso rever para ter uma nova opinião sobre o filme.

pseudo-autor disse...

Acredito que o fato do Spielberg ter realizado esse Amistad depois de faturar o Oscar pelo A Lista de Schindler fez com que as exigências por parte do público ao seu cinema aumentassem muito (daí muita gente da blogosfera não ter gostado do filme). Eu acho regular, já vi o tio Spielberg fazer coisas piores.

Cultura na web:
http://culturaexmachina.blogspot.com

Anônimo disse...

Admiro praticamente toda a carreira de Spielberg, mas este 'Amistad' (ainda que interessante) é o menos 'Spielberg'.

http://filme-do-dia.blogspot.com/

Katia Zerbini disse...

Verdadeira obra prima de Spielberg, Amistad nos toca o coração sim por nos trazer a tona temas fundamentais para a evolução da humanidade - liberdade, igualdade, fraternidade e direito. Não há como falar em direitos omitindo discussões e discursos, por vezes longos, como foram os expostos no longa. No filme A Lista de Schindler Spielberg também emociona abordando assuntos diferentes, tais como a coragem de um indivíduo em dispor de todo seu patrimonio e por em risco a vida pelo próximo. Ambos os filmes nos emocionam com fatos históricos de extrema crueldade da humanidade, a escravidão e o holocausto, porém devemos nos ater que o diretor explora essas emoções de formas diferentes. Ressaltando, não há como falar sobre liberdade e direitos sem explorar o mundo jurídico, sem debates, discussões. Finalizando, para tecermos críticas devemos ser imparciais. Para que o objetivo do filme fosse alcançado, como foi, não seria necessário carregar o longa de cenas extremamente chocantes explorando o sofrimento dos negros com a separação de suas famílias, os castigos, açoites, surras, prisões, enfim, toda a crueldade a que foram submetidos os escravos. O diretor alcançou sim seu objetivo levando o espectador a entrar na discussão sobre a dignidade do indivíduo, liberdade e igualdade. Cuidado... para que a crítica não seja injusta, há que se conhecer o real objetivo da obra.

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