DONNIE BRASCO (Donnie Brasco, 1997, Sony Pictures/Mandalay Entertainment, 127min) Direção: Mike Newell. Roteiro: Paul Attanasio, livro de Joseph D. Pistone, Richard Woodley. Fotografia: Peter Sova. Montagem: Jon Gregory. Música: Patrick Doyle. Figurino: Aude Bronson-Howard, David Robinson. Direção de arte/cenários: Donald Graham Burt/Leslie Pope. Produção executiva: Alan Greenspan, Patrick McCormick. Produção: Louis DiGiaimo, Mark Johnson, Barry Levinson, Gail Mutrux. Elenco: Al Pacino, Johnny Depp, Michael Madsen, James Russo, Anne Heche, Bruno Kirby, Zeljko Ivanek, Paul Giamatti, Tim Blake Nelson. Estreia: 24/02/97
Indicado ao Oscar de Roteiro Adaptado
Durante seis anos, entre 1978 e 1984, o agente especial do FBI Joseph Pistone trabalhou infiltrado entre os mafiosos de Nova York, quase sem contato com a própria família e conquistando a confiança de um dos integrantes do grupo, que passou a considerá-lo como um filho. Tal história, com seus desdobramentos talvez previsíveis mas sempre interessantes, estava pronta para ser contada no cinema desde o lançamento do livro "Donnie Brasco: my undercover life with the Mafia", publicado nos EUA em 1988. Escrito pelo próprio Pistone (cuja cabeça ainda está a prêmio) e o jornalista Richard Woodley, o livro estava nos planos de Hollywood a um bom tempo quando o inglês Mike Newell entrou no projeto: celebrado pelo enorme sucesso de seu "Quatro casamentos e um funeral" (94), Newell chegou com moral, substituindo outro britânico até então considerado para o trabalho (Stephen Frears) e injetando no filme uma elegância e uma sobriedade que possivelmente um cineasta americano não seria capaz de imprimir. Com o elenco liderado por Al Pacino e Johnny Depp - dois nomes populares e de prestígio junto ao público e à crítica - e pronto para estrear no Natal de 1996, "Donnie Brasco" acabou sendo vítima do próprio estúdio: com três outros filmes de grande visibilidade entrando em cartaz quase ao mesmo tempo (e lutando por indicações ao Oscar), a Sony empurrou seu lançamento para fevereiro de 1997. Deu mais ou menos certo: mesmo lançado longe da temporada de premiações, o filme de Newell arrebatou uma indicação na categoria de roteiro adaptado quase um ano depois de sua estreia - e as outras produções da Sony foram relativamente recompensadas pela Academia, em especial "Jerry Maguire: a grande virada", que levou a estatueta de ator coadjuvante (Cuba Gooding Jr.).
Se "Donnie Brasco" tinha mais chances de convencer a Academia do que seus irmãos de estúdio - "O espelho tem duas faces" (96) e "O povo contra Larry Flynt" (96) - é difícil dizer, especialmente em um ano em que as produções independentes foram mais felizes no resultado final. Mas é óbvio que, levando-se em consideração seu tema, seus valores de produção e os vastos elogios da crítica especializada, o filme de Newell tinha tudo para ter uma sorte bem maior se tivesse sido lançado no período adequado - inclusive nas bilheterias, já que não fez muito barulho em casa mas rendeu mais de 120 milhões pelo mundo, em grande parte devido à presença de Johnny Depp, então um jovem astro em ascensão, e Al Pacino, um dos maiores atores do cinema americano. Sua química é um dos motivos que fazem do filme uma das produções mais interessantes do final dos anos 90 - uma narrativa séria e minimalista que lembra os policiais da década de 70 (não por acaso também estrelados por Pacino). Cineasta pouco afeito a malabarismos estéreis, Newell se concentra em caprichar na ambientação e no desenvolvimento dos personagens - cortesia também do roteiro de Paul Attanasio, que equilibra admiravelmente a trama policial com os problemas domésticos do protagonista. Com um elenco coadjuvante igualmente brilhante, "Donnie Brasco" foge facilmente da limitação de gênero, alcançando níveis dramáticos que o elevam acima da média.
A trama é centrada basicamente no relacionamento entre o jovem agente Joseph Pistone - que assume o pseudônimo de Donnie Brasco e é vivido por Johnny Depp de forma discreta, sem os habituais exageros que se tornaram característica de seus desempenhos - e o mafioso Lefty Ruggiero (Al Pacino), que, apesar de não ser o chefão do grupo, lhe serve como ponte de acesso a nomes, crimes e detalhes dos delitos cometidos por outros integrantes do bando, especialmente Sonny Black (Michael Madsen), que se torna o líder durante a temporada do rapaz como infiltrado. Enquanto vai se tornando parte integrante da quadrilha, Donnie vai se afastando da esposa, Maggie (Anne Heche) e das filhas, ao mesmo tempo em que fortalece laços de amizade e quase lealdade com Ruggiero - até que o cerco se fecha e ele precisa redobrar os cuidados para não ser desmascarado e completar sua missão (que inclui, obviamente, mandar seu mentor para a cadeia).
Narrado de forma correta e sem sobressaltos, "Donnie Brasco" é um filme que substitui as cenas de ação alucinantes por um tom de mais densidade psicológica e dramática. Seu registro quase cerebral pode aborrecer a quem procura um filme policial nos moldes mais tradicionais (leia-se tiroteios, perseguições e violência extrema), mas é justamente essa opção de Mike Newell que faz toda a diferença. Seria bastante diferente, por exemplo, se outros nomes cotados para o projeto tivessem assumido o papel central - como Alec Baldwin, Nicolas Cage ou John Cusack, que certamente dariam outro estilo à produção. Dotado de um ritmo atípico, é um filme que envolve o espectador aos poucos, o mergulhando gradativamente em uma trama que fala de amizade, dever, traição e paranoia em doses exatas e tratadas com o máximo de talento. Apesar de se alongar desnecessariamente nos minutos finais, é uma obra pela qual é difícil não se deixar conquistar, senão por sua história incrível, ao menos por sua direção elegante e pelo elenco em ótimo momento. Um dos grandes filmes de Pacino pós-Oscar - e talvez um dos mais subestimados de sua brilhante carreira.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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