Indicado a 4 Oscar: Melhor Produção Artística, Atriz (Janet Gaynor), Fotografia, Direção de arte
Vencedor de 3 Oscar: Melhor Produção Artística, Atriz (Janet Gaynor), Fotografia
Consagrado
pelo imenso prestigio de seu “Nosferatu, uma sinfonia do horror” (22), o
cineasta alemão W.F. Murnau não deixou-se abater pelos problemas judiciais
subsequentes do filme – que levou seu estúdio à falência como resultado de uma
ação movida pelos familiares de Bram Stoker, autor do livro “Drácula”, que lhe
serviu de inspiração – e seguiu sua carreira com respeito cada vez maior.
Depois de algumas produções em seu país natal, ele foi chamado para fazer sua
estreia nos EUA com a promessa de liberdade criativa e dinheiro o bastante para
a construção de mais uma obra-prima. Aceitou o convite, é claro, e seu “Aurora”
deu um passo enorme em direção ao final do cinema mudo. Ok, “O cantor de jazz”,
lançado um pouco depois, ainda em 1927, ficou com a glória e a fama de ser “o
primeiro filme falado da história”, mas basta prestar atenção na estreia de
Murnau nos estúdios Fox para perceber que já havia nele elementos que apontavam
para tal avanço na indústria. Não à toa, ele acabou por receber três estatuetas
do Oscar na primeira cerimônia do Oscar – que nem se chamava Oscar ainda – em
1929: melhor fotografia, melhor atriz (Janet Gaynor, premiada também por seu
desempenho em outros duas produções) e “produção artística e notável” (seja lá
o que exatamente essa categoria quisesse dizer além do fato de que o vencedor
de melhor filme, “Asas”, não foi tão bem sucedido assim junto aos eleitores,
ainda amadores na função de equilibrar merecimento real e política).
Em sua primeira incursão no cinema
americano, Murnau optou por um viés mais realista do que em seus filmes
alemães, calcados em uma alta dose de fantasia – ele já havia adaptado o
clássico “Fausto”, de Goethe – e centrou sua narrativa em um triângulo amoroso
que, segundo suas próprias palavras, poderia situar-se em qualquer época e
qualquer lugar”. Sem abdicar da sofisticação visual que era sua marca
registrada – a fotografia de Karl Strauss e Charles Rosher é inspirada tanto na
escola expressionista quanto nas obras do pintor holandês Vermeer – o cineasta
acrescenta a ela novidades sonoras, como efeitos gravados diretamente na
película que mergulham o espectador na história de forma até então inédita, e
uma trama cuja aparente simplicidade faz com que a identificação da plateia
seja imediata – coisa que dificilmente pode ser dita dos trabalhos anteriores
do diretor. Esse realismo é enfatizado também pelo desempenho admirável de seus
atores centrais.
Tudo bem que
Janet Gaynor foi premiada com o Oscar também por “Sétimo céu” e “O anjo das ruas”,
mas sua atuação é um dos pontos altos de “Aurora”. Ela interpreta uma
personagem sem nome que leva uma vida tranquila e agradável com o marido e o
filho pequeno em uma fazenda do interior dos EUA. O que ela nem desconfia é que
seu parceiro (George O’Brien) não parece compartilhar da felicidade conjugal e
bucólica do campo: tentado pelas fantasias de uma amante (Margaret Livingston),
ele sonha abandonar o campo e viver rodeado de luxo em uma civilização distante
de sua rotina rural. Para tanto, o casal de adúlteros trama a morte da jovem esposa
durante o passeio a um parque de diversões. Quando está em vias de cometer o
crime, porém, o marido muda de ideia – principalmente porque nota que sua
vítima percebeu suas cruéis intenções – e se redescobre apaixonado.
Lembrando em alguns momentos a trama
central de “Uma tragédia americana”, de Theodore Dreiser – que George Stevens
filmou mais de duas décadas mais tarde com o nome “Um lugar ao sol” – “Aurora”
equilibra com maestria momentos de grande suspense com cenas de um romantismo
quase poético. Usando com grande economia os intertítulos – e mesmo assim o
fazendo com criatividade e inteligência – Murnau levou ao cinema americano o
requinte narrativo e visual que caracterizava sua obra na Europa e contribuiu
de forma decisiva no aprimoramento de uma indústria ainda incipiente e carente
de grandes artistas (e não apenas artesãos competentes). Sua narrativa de
estrutura simples e soluções imagéticas brilhantes (com fusões ainda hoje
impressionantes), porém, não atraiu o público. Fracasso de bilheteria, “Aurora”
acabou por fazer com que a Fox se sentisse no direito de interferir nos dois
próximos filmes de Murnau sob seu contrato – “Quatro demônios” (28) e “A garota
da cidade” (30) foram tão mutilados que o diretor abandonou o estúdio para
realizar seu último trabalho, “Tabu” (31), e morrer uma semana antes da
estreia.
Realizado por um cineasta de
elegância e sofisticação acima de qualquer suspeita – formado em História e
Literatura e piloto durante a I Guerra Mundial – “Aurora” é um filme
indispensável por vários motivos: pela construção dramática além de seu tempo,
pela fotografia criativa e influente, pela direção de atores (naturalista e
moderna), pelos avanços tecnológicos quanto ao som e também por ter sido um dos
vencedores da primeira entrega do Oscar. Mas, acima de tudo, é uma prova de que
nem sempre palavras são essenciais quanto de trata de contar uma história
através da imagem – coisa da qual não custa nada lembrar de vez em quando.
3 comentários:
Clenio, vc descobre filmes de 1920. Filmes e atores que nunca ouvi falar, quase sempre.
Mas é muito bom ler sua análise.
Este filme é excelente, embora sendo de 1920!
Muito bom tbm é "A Última Gargalhada" tbm de F. W. Murnau.
Sérgio.
Liliane minha cara, não é.que ele descobre,provavelmente como cinéfilo, crítico e apreciador da sétima arte, ele conhece filmes clássicos como esse que marcou época e ficou pra sempre na história.Nao sou crítico, nem sequer chego perto do conhecimentos e sabedoria do Clênio, mas procuro saber, pesquisar e assistir sobre tudo relacionado ao cinema.
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