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O HOMEM NAS TREVAS

O HOMEM NAS TREVAS (Don't breath, 2016, Screen Gems, 88min) Direção: Fede Alvarez. Roteiro: Fede Alvarez, Rodo Sayagues. Fotografia: Pedro Luque. Montagem: Eric L. Beason, Louise Ford, Gardner Gould. Música: Roque Baños. Figurino: Carlos Rosario. Direção de arte/cenários: Naaman Marshall/Zsuzsa Mihalek. Produção executiva: Joe Drake, Matthew Hart, Nathan Kahane, Erin Westerman, J.R. Young. Produção: Fede Alvarez. Elenco: Stephen Lang, Dylan Minnette, Jane Levy, Daniel Zovatto. Estreia: 12/3/16

Esqueça de lado o excesso de sanguinolência e o humor negro que vem caracterizando o cinema de terror nas últimas décadas: "O homem nas trevas" tem muito mais elementos do clima claustrofóbico de um filme de suspense dos anos 70 do que da obra anterior de seu diretor, o uruguaio Fede Alvarez. Responsável pelo remake de "A morte do demônio", lançado em 2013, Alvarez segue o caminho inverso em seu segundo longa-metragem, optando por um modo menos óbvio de prender a atenção (e a respiração) da plateia: sai o horror físico e explícito para dar lugar a uma linguagem mais sutil mas nem por isso menos assustadora e tensa. Realizado a um custo irrisório de cerca de 10 milhões de dólares, seu filme rendeu mais de 150 milhões pelo mundo afora, conquistando público e crítica com seu domínio narrativo e alguns momentos da mais pura angústia - sem para isso precisar de efeitos mirabolantes, astros consagrados ou campanhas milionárias de marketing. Uma gratíssima surpresa para os fãs do gênero, "O homem nas trevas" é, sem favor, um dos mais interessantes e inteligentes suspenses dos últimos anos, conciso e surpreendente na medida certa.

Aparentemente, a trama de "O homem nas trevas" é simples e sem novidades, mas o roteiro prepara algumas surpresas até mesmo para o mais escolado dos espectadores. Os protagonistas são três jovens insatisfeitos com sua rotina tediosa em Detroit que lidam com suas frustrações invadindo casas para praticar pequenos roubos. Rocky (Jane Levy) sonha em sair da cidade e dar uma vida melhor para sua irmã pequena, tratada com desleixo pela mãe e pelo padrasto; seu namorado, Money (Daniel Zovatto) é um delinquente juvenil acostumado com uma vida de contravenções; e o melhor amigo deles, Alex (Dylan Minette, da série "13 reasons why") é quem facilita seus projetos, aproveitando-se do fato de seu pai trabalhar em uma empresa de segurança que lhe dá acesso a senhas dos moradores. Apaixonado por Rocky, Alex de certa forma se sente inseguro quanto às invasões, mas se deixa levar pela dupla até que uma grande chance lhes aparece à frente, acenando com a possibilidade de dinheiro suficiente para encerrar a carreira de roubos e realizar seus planos imediatos: entrar na casa isolada de um veterano de guerra, cego, que tem escondido consigo uma bolada ganha como indenização pela morte da única filha. Parece barbada: roubar de um homem idoso e cego não deve ser complicado, pensam os jovens. Porém, nem tudo sai como o esperado: com sua experiência de guerra, o dono da casa (Joseph Lang) não pretende deixar que os invasores atinjam seu objetivo, e o que parecia um simples lar passa a parecer-se com um labirinto quando começa um angustiante jogo de gato e rato, repleto de surpresas e acontecimentos chocantes.


Sem deixar o ritmo cair em termos de suspense e reviravoltas, o roteiro de "O homem nas trevas" conduz o espectador a uma viagem sem destino certo, onde cada trecho apresenta uma novidade que altera sua trajetória. Ao transformar a vítima em algoz e mudar as regras do jogo constantemente, o filme de Alvarez impede o público de prever os passos seguintes dos personagens - e suas ações, que passam a ser derivadas não mais de sua ambição, mas por pura e simples vontade de sobreviver.  De forma inteligente e sagaz, o cineasta não hesita em alterar o rumo da narrativa para confundir e mudar também a empatia do público, que se deixa levar com prazer pelos desvios da trama até seu final - um clímax poderoso como poucas vezes o cinema de suspense apresentou nos últimos anos, ainda que um tanto longo demais. De certo modo, porém, até mesmo a demora em encerrar sua história (até então concisa e direta) é uma maneira de provocar incômodo e mais tensão - cortesia da trilha sonora discreta e da edição competente.

Encontrando ainda espaço para algumas referências espertas ao universo do suspense - o cachorro de "Cujo" e alguns detalhes que remetem a "O silêncio dos inocentes" -, Fede Alvarez acaba por criar uma pequena obra-prima do gênero. Despretensioso e de uma simplicidade admirável em tempos de orçamentos inchados e efeitos visuais que mais atrapalham do que ajudam, "O homem nas trevas" comprova a teoria de que em muitos casos - em especial quando se trata de filmes de suspense - menos realmente é mais: quase totalmente passado em um único cenário, com apenas quatro atores e uma trama enxuta, o filme atinge níveis de tensão que muitas superproduções sequer conseguem arranhar. Um belo passo adiante na carreira de seu diretor, "O homem nas trevas" é um filme incapaz de desagradar aos fãs do gênero - e ainda deixa a porta aberta para (talvez desnecessária) continuação. Se ela for do mesmo nível será muito bem-vinda!

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