quarta-feira

O SEGREDO


O SEGREDO (The chamber, 1996, Universal Pictures, 11min) Direção: James Foley. Roteiro: William Goldman, Phil Alden Robinson (Chris Reese), romance de John Grisham. Fotografia: Ian Baker. Montagem: Mark Warner. Música: Carter Burwell. Figurino: Tracy Tynan. Direção de arte/cenários: David Brisbin/Lisa Fischer. Produção executiva: David Friendly, Karen Kehela., Ric Kidney. Produção: John Davis, Brian Grazer, Ron Howard. Elenco: Chris O'Donnell, Gene Hackman, Faye Dunaway, Robert Prosky, Raymond J. Barry, Lela Rochon, Bo Jackson, David Marshall Grant. Estreia: 11/10/96

Entre 1993 e 1996, um dos nomes mais quentes em Hollywood não era um astro milionário, um cineasta prestigiado ou um produtor poderoso. Ao transformar em livros seu conhecimento como advogado e sua experiência em tribunais, John Grisham, passou, em poucos anos, de um escritor principiante a um dos autores mais requisitados pelos estúdios, sempre em busca de material para suprir a demanda de um público ávido por boas histórias. Com o apoio nada desprezível de atores como Tom Cruise, Julia Roberts, Denzel Washington e Susan Sarandon - e diretores respeitados como Sydney Pollack, Alan J. Pakula e, vá lá, Joel Schumacher - as adaptações das obras de Grisham se mostravam uma mina de ouro, se não inesgotável ao menos generosa. Assim, "A firma" (1993), "O Dossiê Pelicano" (1993), "O cliente" (1994) e "Tempo de matar" (1996) ultrapassaram a marca de 100 milhões de dólares de arrecadação e firmaram seu nome como um atestado de qualidade. Porém, como não poderia deixar de acontecer, nem todo sucesso dura para sempre - e qualquer falha no processo pode resultar em um inesperado fracasso. Foi o que aconteceu com "O segredo": com uma renda mundial que não chegou a cobrir metade de seu orçamento, estimado em 50 milhões, o filme dirigido por James Foley mostrou que nada - nem ninguém - é infalível.

Lançado poucos meses depois de "Tempo de matar", dirigido por Joel Schumacher e com um elenco que incluía Samuel L. Jackson, Kevin Spacey, Sandra Bullock e um Matthew McConaughey a caminho do estrelato, "O segredo" já estreou em desvantagem: apesar de ser um ator em franca ascensão à época -  no mínimo desde sua parceria com Al Pacino em "Perfume de mulher" (1992) -, Chris O'Donnell ainda não parecia capaz de segurar sozinho (ou quase) uma bilheteria sólida, em especial em comparação com a primeira escolha para o papel principal do filme, Brad Pitt. Mais jovem, com menos experiência e sem nenhum grande sucesso solo no currículo, O'Donnell acabou por se tornar o principal alvo das críticas - mesmo que não seja o responsável pelos problemas de bastidores que, logicamente, respingaram no resultado final, que não agradou nem mesmo ao próprio John Grisham. Desde a saída de Pitt - consequência da opção de Ron Howard em comandar "O preço de um resgate" (1996) -, o projeto de "O segredo" parecia fadado pelo menos a uma produção problemática. O roteirista William Goldman, por exemplo, viu parte de seu trabalho rejeitado por Howard (ainda produtor do filme) e pelo novo diretor, James Foley - e depois testemunhou seu substituto, Phil Alden Robinson, preferir assiná-lo com um pseudônimo por não concordar com a versão final. Além disso, a ideia de oferecer a direção a Foley - que lançou o suspense "Medo" no mesmo ano para a mesma Universal Pictures - não foi das mais felizes: se a trama já não é tão eletrizante quanto a de outros livros de Grisham, o trabalho de Foley pouco faz para acentuar suas qualidades ou amenizar seus defeitos. Quase no piloto automático, o cineasta falha em sua principal missão: conectar o espectador com seu protagonista.

 

Jovem e idealista como quase todos os personagens centrais de Grisham (talvez seus alter-egos), Adam Hall (Chris O'Donnell, esforçado mas nada mais do que isso), acaba de sair da faculdade de Direito e para seu primeiro caso importante escolhe um desafio dos maiores: evitar que um condenado à câmara de gás seja executado. Culpado pelo assassinato de duas crianças judias trinta anos antes, Sam Cayhall (Gene Hackman) assume a autoria do crime, não demonstra nenhum arrependimento e parece se orgulhar de suas ideias racistas - transmitidas a eles através de gerações. Mas Adam tem seus motivos para lutar pela suspensão da pena do irascível presidiário: Sam é seu avô, e apesar das consequências trágicas do crime, como o suicídio de seu pai, o jovem advogado quer, mais do que tudo, investigar as raízes de tanto ódio e tentar extirpá-las do próprio futuro. Para isso, conta com a ajuda hesitante de uma tia, Lee (Faye Dunaway), viciada em álcool e envergonhada do passado da família, ela esconde suas origens, mas vê na chegada do sobrinho uma oportunidade de curar feridas antigas e ainda doloridas.

Visto à luz do tempo, "O segredo" não é o horror que muitos fizeram pensar quando de sua estreia. Mesmo que não tenha o mesmo brilho de outros filmes baseados em obras de Grisham - em especial "O cliente", que deu a Susan Sarandon uma indicação ao Oscar, e "O homem que fazia chover", um dos poucos Francis Ford Coppola da década de 1990 -, o resultado final tem qualidades que foram ignoradas em seu lançamento. A atuação monstruosa de Gene Hackman é um exemplo: mesmo com um personagem quase maniqueísta, o veterano ator oferece ao público um trabalho precioso, repleto de uma energia que falta ao protagonista de Chris O'Donnell. E se Faye Dunaway - em papel oferecido a Sigourney Weaver - foi indicada ao Framboesa de Ouro, isso diz mais sobre a implicância de parte da crítica sobre seu desempenho do que exatamente por justiça: por mais que exagere em alguns momentos, a atriz, vencedora do Oscar por "Rede de intrigas" (1976), constrói uma personagem que reflete com perfeição as consequências do ódio e da intolerância. São os veteranos astros que dão a "O segredo", apesar de suas falhas, motivos para que lhe seja feita justiça: mesmo estando longe de ser um filme marcante, tampouco é a aberração que seu fracasso comercial poderia dar a entender.

 

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