INDISCRIÇÃO (Christmas in Connecticut, 1945, Warner Bros, 101min) Direção: Peter Godfrey. Roteiro: Lionel Houser, Adele Commandini, estória de Aileen Hamilton. Fotografia: Carl Guthrie. Montagem: Frank Magee. Música: Frederick Hollander. Figurino: Milo Anderson. Direção de arte/cenários: Stanley Fleischer/Casey Roberts. Produção executiva: Jack L. Warner. Produção: William Jacobs. Elenco: Barbara Stanwyck, Dennis Morgan, Sydney Greenstreet, Reginald Gardiner, S. Z. Sakall, Robert Shayne, Una O'Connor, Frank Jenks, Joyce Compton, Dick Elliott. Estreia: 11/8/45
O fim da II Guerra Mundial, em agosto de 1945, não foi um alívio apenas econômico e social: parecia que finalmente, com a derrota da Alemanha nazista, as coisas iriam voltar ao normal, inclusive em Hollywood. Era hora de comemorar a vitória e ter esperanças de um futuro mais auspicioso - e antes que filmes sobre o conflito e seus personagens começassem a pipocar nos cinemas, contando a história já com gostinho de ufanismo, nada mais certeiro do que agradar ao público com comédias leves e despretensiosas, que combinassem com o novo astral. E um dos primeiros filmes a se beneficiarem dessa euforia não poderia caber melhor nessa receita: dirigido pelo britânico Peter Godfrey (um nome reconhecido dos palcos ingleses), "Indiscrição" é uma deliciosa comédia romântica, estrelada por uma atriz mais lembrada por seus papéis dramáticos do que por seus dotes cômicos. Uma bela surpresa para muitos, o show maior do filme de Godfrey é de Barbara Stanwyck, que herdou a protagonista com a saída de Bette Davis do projeto.
Recém saída de "Pacto de sangue" (1944), um de seus filmes mais populares - e onde encarnou uma típica femme fatale do cinema noir -, Stanwyck se reinventa como heroína cômico/romântica, um papel que, futuramente, poderia tranquilamente ser encarnado por Meg Ryan ou Katherine Heigl (mas talvez sem o mesmo resultado). Sem apoiar-se na beleza ou sensualidade, a atriz constrói sua Elizabeth Lane a partir de uma série de mal-entendidos que vão revelando, aos poucos, sua verdadeira natureza sentimental: a princípio uma mulher sem interesses na vida doméstica ou familiar, Lane vai, aos poucos, se apresentando diante do público como uma típica protagonista do gênero - ainda que muito mais independente e geniosa que a maioria delas. Ligeiramente inspirada em uma personalidade real - uma colunista chamada Gladys Taber, colaboradora da revi, sta Family Circle, então popular -, Lane é a antítese da mulher desprotegida e ingênua: conhecida nacionalmente por sua coluna na revista Smart Housekeeping, ela mantém a imagem de dona-de-casa exemplar, encantando seus leitores com a descrição de uma vida simples ao lado do marido, do filho e de um grande talento na cozinha. Acontece que, na verdade, esta imagem não corresponde à verdade, uma vez que ela não apenas é solteira como jamais morou na fazenda onde diz morar e tampouco saber fritar sequer um ovo. Tudo poderia ficar eternamente dessa forma, mas uma inesperada situação muda completamente sua rotina.
Às vésperas do Natal, o editor da revista, Alexander Yardley (Sydney Greenstreet), lhe comunica que, como uma espécie de ação de marketing, irá proporcionar a um soldado recém chegado da guerra que passe os feriados de final de ano junto com a família de Elizabeth. Pior ainda: ele mesmo irá unir-se ao grupo, no que considera um grande e feliz evento. Com medo da possibilidade de ser desmascarada e perder o emprego, a colunista toma uma atitude desesperada e aceita se casar com um dedicado pretendente, John Sloan (Reginald Gardiner) - dono de uma fazenda no interior de Connecticut. Seu plano é tentar manter as aparências até o fim do feriado, com a ajuda do amigo Felix Bassenak (S. Z. Sakall), um chefe de cozinha que é o verdadeiro dono das receitas que ela publica - mas as coisas saem do previsto quando ela se apaixona pelo soldado, Jefferson Jones (Dennis Morgan), e põe em risco o teatro. A partir daí, é um festival de troca de bebês, diálogos inspirados, mal-entendidos e um toque de romance na medida certa.
Apesar do título original - "Natal em Connecticut" - e do tema, "Indiscrição" estreou nos EUA no mesmo mês de agosto que decretou o final da guerra. Teve sorte: fez um enorme sucesso de bilheteria, principalmente pelo tom alto astral e pela despretensão. Com o objetivo único de entreter e fazer esquecer (ao menos por 100 minutos) os horrores de um conflito que já durava anos, o filme encontrou seu público e rendeu muito mais do que seu estúdio, a Warner, esperava. Foi um sucesso merecido: é engraçado, leve, dinâmico e inteligente como um bom passatempo deve ser. Não é dos clássicos mais conhecidos, mas até mesmo quem tem preconceito contra o gênero pode perceber suas qualidades. É um filme que merece ser redescoberto!
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
sábado
Assinar:
Postar comentários (Atom)
JADE
JADE (Jade, 1995, Paramount Pictures, 95min) Direção: William Friedkin. Roteiro: Joe Eszterhas. Fotografia: Andrzej Bartkowiak. Montagem...
-
EVIL: RAÍZES DO MAL (Ondskan, 2003, Moviola Film, 113min) Direção: Mikael Hafstrom. Roteiro: Hans Gunnarsson, Mikael Hafstrom, Klas Osterg...
-
ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA (Presumed innocent, 1990, Warner Bros, 127min) Direção: Alan J. Pakula. Roteiro: Frank Pierson, Alan J. Paku...
-
NÃO FALE O MAL (Speak no evil, 2022, Profile Pictures/OAK Motion Pictures/Det Danske Filminstitut, 97min) Direção: Christian Tafdrup. Roteir...
Nenhum comentário:
Postar um comentário