LIVRAI-NOS DO MAL (Deliver us from Evil, 2014, Screen Gems/Jerry
Bruckheimer Films, 118min) Direção: Scott Derrickson. Roteiro: Scott
Derrickson, Paul Harris Boardman, livro de Ralph Sarchie, Lisa Collier
Cool. Fotografia: Scott Kevan. Montagem: Jason Hellman. Música:
Christopher Young. Figurino: Christopher Peterson. Direção de
arte/cenários: Bob Shaw/Ellen Christiansen. Produção executiva: Paul
Harris Boardman, Glenn S. Gainor, Chad Oman, Mike Stenson, Ben Waisbren.
Produção: Jerry Bruckheimer. Elenco: Eric Bana, Édgar Ramírez, Olivia
Munn, Chris Coy, Dorian Missick. Estreia: 24/6/14
O cineasta Scott Derrickson adora misturar filmes de terror com outros gêneros que aparentemente não permitiriam tal conexão. Foi isso que ele fez em "O exorcismo de Emily Rose", de 2005, baseado em uma história real e que caiu no gosto da crítica e do público ao equilibrar com segurança um assustador conto de horror com um filme de tribunal. Quase dez anos - e um fracasso no caminho, o remake da ficção científica "O dia em que a Terra parou", de 2008 - o diretor voltou a buscar na fusão de estilos a inspiração para um novo trabalho. Nascia "Livrai-nos do mal", que misturava elementos dos filmes sobre possessões demoníacas com uma tradicional narrativa de filme policial. Não deu certo. Vendido como baseado em fatos reais - descritos pelo detetive da polícia nova-iorquina Ralph Sarchie em seu livro de mesmo nome - o filme acabou apenas empatando seu orçamento de 30 milhões de dólares nas bilheterias americanas e não convenceu a crítica. E o pior é que motivos não faltaram para tal apatia: apesar de ter o sempre dedicado Eric Bana à frente do elenco - substituindo a escolha inicial para o papel, Mark Wahlberg - o filme de Derrickson tropeça justamente no que tinha tudo para ser seu maior trunfo, e fica a dever tanto como filme de terror quanto como policial.
Tudo começa muito bem e dá para perceber o talento do diretor em criar um clima e prender a atenção da plateia: em uma noite chuvosa em Nova York, o detetive Ralph Sarchie (Eric Bana) encontra o corpo sem vida de um bebê jogado em uma lixeira e é chamado, junto a seu parceiro, Jimmy (Chris Coy), a atender um chamado no zoológico da cidade, onde uma mulher, aparentemente sem motivo algum, acaba de atirar seu filho pequeno na jaula dos leões. Os dois policiais chegam quando a criança já está a salvo, mas investigações mais profundas ligam a mulher, Jane Crenna (Olivia Horton), a um trio de ex-soldados americanos com históricos de comportamento violento e imprevisível. Sentindo vibrações pouco saudáveis à sua volta, Sarchie - conhecido por seus colegas como um homem cujos pressentimentos são sempre confiáveis - se aproxima do Padre Mendoza (Edgar Ramírez), um sacerdote pouco convencional que tenta convencê-lo que a razão da violência que cerca Jane é um ritual demoníaco que eles devem, juntos, tentar impedir de acontecer.
A produção de "Livrai-nos do mal" é exemplar. A fotografia sombria e em tons amarelados dá a exata dimensão do suspense da história (ainda que seja escura demais em alguns momentos) e a trilha sonora (apesar de apelar para o clichê quando usa The Doors como elo entre o mal e suas vítimas) pontua com destreza um bom desenho de som, que enfatiza sem espaço para dúvidas todos os (vários) momentos de tensão que pontuam a narrativa. Em especial no clímax - poderoso, perturbador e chocante, mas infelizmente prejudicado por sua demora em acontecer - a união de todos esses elementos dramáticos acontece de forma orgânica e inteligente, oferecendo ao público o que ele espera quando assiste a um filme de terror. Mas acontece que, ao tentar amenizar o tom sobrenatural da trama e fincá-la mais na realidade, o roteiro acaba por diluir o impacto de suas melhores sequências.
Eric Bana está bem na pele do protagonista, acertando mais uma vez em uma atuação que ilustra com perfeição os conflitos internos de seu personagem - que são revelados ao espectador em uma cena especialmente interessante - e Edgar Ramírez também está no ponto como o imprevisível Padre Mendoza. Os sustos estão todos no lugar, a maquiagem é caprichada e a tensão é palpável. Por que, então, "Livrai-nos do mal" não funciona tão bem como deveria? Talvez seja culpa do roteiro, que insiste em fazer um cruzamento nem sempre satisfatório entre os dois gêneros, talvez seja culpa da direção de Derrickson, que tenta abraçar muitas ramificações da trama sem saber como dar conta de todas elas. A história começa muito interessante, mas vai se esvaziando cada vez mais, até chegar a um final que, a despeito de extremamente bem-filmado, carece de força dramática - é pouco provável que o espectador ainda esteja se importando com os personagens quando chega o momento mais crítico da história, e isso, como se sabe, é um pecado mortal para qualquer filme.
No fim das contas, "Livrai-nos do mal" é um filme de terror superior à média, com uma produção bem cuidada e uma nítida preocupação em encantar e chocar a plateia com seu visual caprichado. Porém, erra feio ao tropeçar em suas próprias ambições, se arrastando sem muito critério até um clímax capaz de atenuar seus defeitos. Vale uma sessão, mas não será tão marcante quanto poderia.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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