EX-MACHINA: INSTINTO ARTIFICIAL (Ex Machina, 2014, Universal Pictures International, 108min) Direção e roteiro: Alex Garland. Fotografia: Rob Hardy. Montagem: Mark Day. Música: Geoff Barrow, Ben Salisbury. Figurino: Sammy Sheldon Differ. Direção de arte/cenários: Mark Digby/Michelle Day. Produção executiva: Eli Bush, Tessa Ross, Scott Rudin. Produção: Andrew Macdonald, Allon Reich. Elenco: Domhnall Gleeson, Oscar Isaac, Alicia Vikander, Sonoya Mizuno. Estreia: 16/12/14
2 indicações ao Oscar: Roteiro Original, Efeitos Visuais
Vencedor do Oscar de Efeitos Visuais
A cerimônia do Oscar 2016 não foi exatamente surpreendente, com as esperadas vitórias de Leonardo DiCaprio, Brie Larson e "Spotlight: segredos revelados" nas principais categorias e o arrastão proporcionado por "Mad Max: Estrada da fúria". Mas mesmo assim, a Academia sempre guarda um trunfo para não deixar a noite tão previsível e nessa ocasião o susto, em especial para as grandes produções que concorriam ao prêmio de efeitos visuais, foi imenso: concorrendo contra pesos-pesados como "Star Wars: o despertar da força", "Mad Max" e "O regresso" (todos com orçamentos acima dos 150 milhões de dólares), o pequeno "Ex-machina: instinto artificial", com seu custo irrisório de 15 milhões, levou a estatueta e reafirmou sua posição de Davi contra Golias. Pouco visto nos cinemas americanos (ao menos em comparação com seus oponentes diretos) e lançado sem muito alarde, a estreia do roteirista e escritor Alex Garland como cineasta é uma instigante e curiosa fantasia a respeito do alcance da Ciência em um futuro não muito distante. Usando os efeitos especiais como parte integrante da narrativa e não como um espetáculo à parte, o filme envolve a plateia em um jogo de manipulação que só fará sentido completamente nos minutos finais. Ao não subestimar a inteligência do espectador, Garland criou uma pequena pérola, uma ficção científica que tem apelo até mesmo àquele que torcem o nariz em relação ao gênero.
Tudo começa quando o jovem programador Caleb Smith (Domhnall Gleeson, cada vez mais presente nas telas) é escolhido para passar uma semana na propriedade isolada do misterioso e misantropo Nathan Bateman (Oscar Isaac), dono da empresa de informática onde ele trabalha. Introvertido e quase antissocial, o órfão e solitário Caleb ouve do próprio Nathan - um homem tanto excêntrico quanto genial - o motivo de sua visita: o que o milionário deseja é testar o quão longe foi em suas pesquisas a respeito de inteligência artificial. Para isso, apresenta a seu jovem funcionário à bela Ava (Alicia Vikander), um robô com aparência quase humana e inteligência acima da média. Sendo obrigado a dar um parecer depois de apenas algumas sessões a sós com Ava, o desajeitado Caleb acaba se deixando envolver pelo fascínio de estar diante de uma invenção humana e, aos poucos, começa a questionar as reais intenções de Nathan - sendo impelido por Ava a duvidar da honestidade do programa.
Como um jogo de gato e rato engenhoso e brilhantemente executado, "Ex-machina" é fascinante e hipnotizante: cada detalhe da direção de arte minimalista é crucial para o desenvolvimento da trama e suas inteligentes metáforas visuais. Com uma estética clean, quase desprovida de elementos mais elaborados, Garland cria uma atmosfera de suspense e expectativa que mantém a atenção até o final: as conversas entre Caleb e Ava são um perfeito exemplo da técnica do cineasta novato: ela é a experiência, mas a cada sessão quem mais se percebe preso e confinado é ele. A fotografia de Rob Hardy contribui para o clima opressivo, assim como a trilha sonora quase imperceptível, que enfatiza a solidão dos três protagonistas, cada um afogado em seus próprios dilemas éticos, morais e pessoais - o que inclui até (e principalmente) Ava. Misturando discussões filosóficas a uma trama por si só bastante interessante e questionadora, o roteiro foge do óbvio sempre que parece estar em vias de cair nas armadilhas das produções do gênero, levando o público mais longe do que se poderia supor em seus minutos iniciais. Fazendo uso de seu talento como escritor - é ele o autor do romance "A praia", que deu origem ao filme de Danny Boyle estrelado por Leonardo DiCaprio em 2000 - e merecidamente indicado ao Oscar de roteiro original, Alex Garland brinca com as percepções da plateia, desenvolve com precisão a personalidade de cada um de seus personagens e cria um desfecho poético e quase perturbador.
E se o roteiro e a direção de Alex Garland revelam um cineasta inteligente e sensível, seus atores não poderiam estar melhores. Domhnall Gleeson aos poucos vai traçando um caminho bastante consistente em Hollywood, marcando presença em sucessos de bilheteria e crítica, como "O regresso", "Invencível" - dirigido por Angelina Jolie - e "Anna Karenina" - a versão estrelada por Keira Knightley e Jude Law: seu estilo suave de interpretação cabe como uma luva em Caleb, um jovem desconfortável na própria pele e que se apaixona por uma inteligência artificial. Oscar Isaac - que Madonna praticamente revelou em "W/E: o romance do século" (2011) e depois seguiu um caminho de grande personalidade artística - constrói um Nathan Bateman exótico em seu brilhantismo, isolado e quase paranoico como a maioria dos gênios. E Alicia Vikander - às vésperas de levar um Oscar de coadjuvante por "A garota dinamarquesa" (2015) - seduz a plateia sem dificuldade, em uma atuação que mescla com maestria trejeitos robóticos e humanos e se revela, em seu final, o trabalho mais impressionante do filme. Uma feliz conjunção de fatores - elenco, direção, roteiro, técnica - e despretensão, "Ex-machina: instinto artificial" é um dos mais admiráveis filmes de sua temporada (e uma das melhores ficções científicas da década).
Vencedor do Oscar de Efeitos Visuais
A cerimônia do Oscar 2016 não foi exatamente surpreendente, com as esperadas vitórias de Leonardo DiCaprio, Brie Larson e "Spotlight: segredos revelados" nas principais categorias e o arrastão proporcionado por "Mad Max: Estrada da fúria". Mas mesmo assim, a Academia sempre guarda um trunfo para não deixar a noite tão previsível e nessa ocasião o susto, em especial para as grandes produções que concorriam ao prêmio de efeitos visuais, foi imenso: concorrendo contra pesos-pesados como "Star Wars: o despertar da força", "Mad Max" e "O regresso" (todos com orçamentos acima dos 150 milhões de dólares), o pequeno "Ex-machina: instinto artificial", com seu custo irrisório de 15 milhões, levou a estatueta e reafirmou sua posição de Davi contra Golias. Pouco visto nos cinemas americanos (ao menos em comparação com seus oponentes diretos) e lançado sem muito alarde, a estreia do roteirista e escritor Alex Garland como cineasta é uma instigante e curiosa fantasia a respeito do alcance da Ciência em um futuro não muito distante. Usando os efeitos especiais como parte integrante da narrativa e não como um espetáculo à parte, o filme envolve a plateia em um jogo de manipulação que só fará sentido completamente nos minutos finais. Ao não subestimar a inteligência do espectador, Garland criou uma pequena pérola, uma ficção científica que tem apelo até mesmo àquele que torcem o nariz em relação ao gênero.
Tudo começa quando o jovem programador Caleb Smith (Domhnall Gleeson, cada vez mais presente nas telas) é escolhido para passar uma semana na propriedade isolada do misterioso e misantropo Nathan Bateman (Oscar Isaac), dono da empresa de informática onde ele trabalha. Introvertido e quase antissocial, o órfão e solitário Caleb ouve do próprio Nathan - um homem tanto excêntrico quanto genial - o motivo de sua visita: o que o milionário deseja é testar o quão longe foi em suas pesquisas a respeito de inteligência artificial. Para isso, apresenta a seu jovem funcionário à bela Ava (Alicia Vikander), um robô com aparência quase humana e inteligência acima da média. Sendo obrigado a dar um parecer depois de apenas algumas sessões a sós com Ava, o desajeitado Caleb acaba se deixando envolver pelo fascínio de estar diante de uma invenção humana e, aos poucos, começa a questionar as reais intenções de Nathan - sendo impelido por Ava a duvidar da honestidade do programa.
Como um jogo de gato e rato engenhoso e brilhantemente executado, "Ex-machina" é fascinante e hipnotizante: cada detalhe da direção de arte minimalista é crucial para o desenvolvimento da trama e suas inteligentes metáforas visuais. Com uma estética clean, quase desprovida de elementos mais elaborados, Garland cria uma atmosfera de suspense e expectativa que mantém a atenção até o final: as conversas entre Caleb e Ava são um perfeito exemplo da técnica do cineasta novato: ela é a experiência, mas a cada sessão quem mais se percebe preso e confinado é ele. A fotografia de Rob Hardy contribui para o clima opressivo, assim como a trilha sonora quase imperceptível, que enfatiza a solidão dos três protagonistas, cada um afogado em seus próprios dilemas éticos, morais e pessoais - o que inclui até (e principalmente) Ava. Misturando discussões filosóficas a uma trama por si só bastante interessante e questionadora, o roteiro foge do óbvio sempre que parece estar em vias de cair nas armadilhas das produções do gênero, levando o público mais longe do que se poderia supor em seus minutos iniciais. Fazendo uso de seu talento como escritor - é ele o autor do romance "A praia", que deu origem ao filme de Danny Boyle estrelado por Leonardo DiCaprio em 2000 - e merecidamente indicado ao Oscar de roteiro original, Alex Garland brinca com as percepções da plateia, desenvolve com precisão a personalidade de cada um de seus personagens e cria um desfecho poético e quase perturbador.
E se o roteiro e a direção de Alex Garland revelam um cineasta inteligente e sensível, seus atores não poderiam estar melhores. Domhnall Gleeson aos poucos vai traçando um caminho bastante consistente em Hollywood, marcando presença em sucessos de bilheteria e crítica, como "O regresso", "Invencível" - dirigido por Angelina Jolie - e "Anna Karenina" - a versão estrelada por Keira Knightley e Jude Law: seu estilo suave de interpretação cabe como uma luva em Caleb, um jovem desconfortável na própria pele e que se apaixona por uma inteligência artificial. Oscar Isaac - que Madonna praticamente revelou em "W/E: o romance do século" (2011) e depois seguiu um caminho de grande personalidade artística - constrói um Nathan Bateman exótico em seu brilhantismo, isolado e quase paranoico como a maioria dos gênios. E Alicia Vikander - às vésperas de levar um Oscar de coadjuvante por "A garota dinamarquesa" (2015) - seduz a plateia sem dificuldade, em uma atuação que mescla com maestria trejeitos robóticos e humanos e se revela, em seu final, o trabalho mais impressionante do filme. Uma feliz conjunção de fatores - elenco, direção, roteiro, técnica - e despretensão, "Ex-machina: instinto artificial" é um dos mais admiráveis filmes de sua temporada (e uma das melhores ficções científicas da década).
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