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EM NOME DO PAI

EM NOME DO PAI (In the name of the father, 1993, Universal Pictures, 133min) Direção: Jim Sheridan. Roteiro: Jim Sheridan, Terry George, livro "Proved innocent", de Gerry Conlon. Fotografia: Peter Biziou. Montagem: Gerry Hambling. Música: Trevor Jones. Figurino: Joan Bergin. Direção de arte/cenários: Caroline Amies/Rick Butler. Produção executiva: Gabriel Byrne. Produção: Jim Sheridan. Elenco: Daniel Day-Lewis, Pete Postletwhaite, Emma Thompson, Anthony Brophy, Corin Redgrave. Estreia: 29/12/93

7 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (Jim Sheridan), Ator (Daniel Day-Lewis), Ator Coadjuvante (Pete Postletwhaite), Atriz Coadjuvante (Emma Thompson), Roteiro Adaptado, Montagem
Vencedor do Urso de Ouro do Festival de Berlim: Melhor Diretor (Jim Sheridan)

Para fins dramáticos, muitas vezes histórias reais são vítimas de alterações das mais variadas em sua transposição para o cinema. Provavelmente "Em nome do pai", filmaço do diretor irlandês Jim Sheridan poderia servir como um dos exemplos máximos disso que é carinhosamente chamado de "licença poética". As diferenças entre os fatos verídicos e os mostrados no filme são tão radicais que nem mesmo seu produtor executivo, o ator Gabriel Byrne, concordou com a visão de Sheridan e afastou-se do projeto. A despeito das discrepâncias entre o real e o filmado, porém, "Em nome do pai" é o melhor trabalho do cineasta e a atuação mais arrasadora de Day-Lewis.

O filme já começa mostrando a que veio quando um pub londrino vai pelos ares e a bela canção-tema (cantada por Bono, do U2) invade os créditos iniciais. Quando os créditos acabam o público fica sabendo  - através de uma fita gravada à advogada Gareth Pierce (Emma Thompson)  - a triste e quase inacreditável história de Gerry Conlon (Day-Lewis), um jovem irlandês condenado à prisão perpétua, acusado de ter planejado o atentado à bomba mostrado na cena inicial. Além de ser inocente - na noite da tragédia ele estava dormindo em um parque ao lado do melhor amigo - Gerry vê uma injustiça ainda maior ser cometida: não só ele e seus amigos são presos, mas também sua tia (acusada de fabricar bombas), seus primos pequenos e seu próprio pai, Giuseppe (Pete Postletwhaite), um homem religioso e correto com quem ele não tem uma relação das mais carinhosas. Forçados a dividir uma cela, pai e filho finalmente começam a criar sentimentos de admiração e amor. Quando Gareth entra em suas vidas - a pedido de um Giuseppe velho e doente - as irregularidades do julgamento começam a aparecer e eles passam a ter esperanças de ver sua sentença anulada.



A maior gritaria a respeito de "Em nome do pai" diz respeito à invenção do roteiro de Sheridan e Terry George - que seria o cineasta de "Hotel Ruanda", de 2004 - de fazer com que Gerry e Giuseppe dividam a mesma cela, fato que jamais ocorreu na história verdadeira. Realmente não é admirar a ira (desculpem o trocadilho infame) dos puristas, mas é impossível negar que, do ponto de vista dramatúrgico, a sacada do roteiro foi de mestre: além de contar uma história forte e revoltante de injustiça jurídica e social (e aí inclui-se preconceito contra hippies e irlandeses em geral), Sheridan também brinda o público com uma trama de alcance emocional de âmbito mais pessoal, que ressoa junto a qualquer espectador mais sensível. Para isso, o cineasta teve a sorte de contar com um elenco de sonhos.

Todos os três atores centrais do filme foram indicados ao Oscar e se premiados tivessem sido, não teria havido injustiça. Então praticamente desconhecido do grande público, Pete Postletwhaite teve aqui o papel mais marcante de sua carreira, criando um Giuseppe estóico e dono de uma fé inabalável. Emma Thompson, ainda que só entre de verdade no filme nos últimos trinta minutos, mostra porque é uma das atrizes britânicas mais competentes de sua geração (e que merece uma ressurreição artística urgente). Mas é Daniel Day-Lewis o corpo e a alma de "Em nome do pai".

Mesmo os detratores do ator são obrigados a tirar o chapéu para seu desempenho impecável. Day-Lewis vive (literalmente) Gerry Conlon, desde sua juventude irresponsável até seus dias de maturidade emocional e racional - passando por uma cena de interrogatório das mais tensas da história. Sem tentar apelar para a compaixão do público, uma vez que a história já é suficientemente revoltante, ele conquista pela inteligência de sua atuação, uma das mais consistentes da década de 90. Day-Lewis pega o público pela mão e o leva a testemunhar seu vasto leque de nuances: debochado, rebelde, revoltado, triste, corajoso. E o faz com a segurança de um grande ator.

Ficar indignado com a história contada em "Em nome do pai" é fácil - e a fotografia de Peter Biziou, a montagem de Gerry Hambling e a música de Trevor Jones apenas colaboram para isso. Difícil é esquecer a monstruosa interpretação de Day-Lewis e a força de sua história.

Um comentário:

renatocinema disse...

Texto e visão brilhante a sua.

Só fico em dúvida sobre um ponto, quando diz: "atuação mais arrasadora de Day-Lewis." esse grande ator teve atuações perfeitas, na minha visão tanto em "Meu Pé Esquerdo" quanto em "Sangue Negro" que fico em dúvida de qual foi seu melhor trabalho.

Parabéns pelo ótimo comentário de um filme que marcou uma geração.

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