DIA
DE TREINAMENTO (Training day, 2001, Warner Bros, 122min) Direção:
Antoine Fuqua. Roteiro: David Ayer. Fotografia: Mauro Fiore. Montagem:
Conrad Buff. Música: Mark Mancina. Figurino: Michele Michel. Direção de
arte/cenários: Naomi Shohan/Jan Pascale. Produção executiva: Bruce
Berman, Davis Guggenheim. Produção: Jeffrey Silver. Elenco: Denzel
Washington, Ethan Hawke, Scott Glenn, Tom Berenger, Harris Yulin,
Raymond J. Barry, Cliff Curtis, Dr. Dre, Eva Mendes, Snoop Dogg, Macy
Gray. Estreia: 02/9/01 (Festival de Veneza)
2 indicações ao Oscar: Ator (Denzel Washington), Ator Coadjuvante (Ethan Hawke)
Vencedor do Oscar de Melhor Ator (Denzel Washington)
Um
dos atores negros mais importantes de sua geração e certamente da
história do cinema americano, Denzel Washington construiu sua carreira
interpretando homens de personalidade forte, frequentemente desafiando o
sistema e o preconceito, em especial como o ativista Steve Biko de "Um
grito de liberdade" e o ícone máximo "Malcolm X", trabalhos que lhe
deram indicações ao Oscar - prêmio que veio pela primeira vez como
coadjuvante, por seu desempenho como um escravo fugido que se alista no
Exército americano durante a Guerra de Secessão, em "Tempo de glória".
Não deixou de ser uma surpresa, portanto, que seu Oscar de melhor ator
principal tenha chegado por "Dia de treinamento", onde ele interpreta
Alonzo Harris, um policial da divisão de narcóticos de Los Angeles que,
apesar de dominador e intenso, joga do lado oposto da lei. Corrupto,
violento e amoral, Alonzo Harris é a antítese de todos os personagens
vividos por Washington até então e, talvez justamente por isso, é um dos
mais empolgantes de sua vitoriosa trajetória.
Marcando
história pelo fato de pela primeira vez um ator negro ser premiado com o
Oscar por um filme dirigido por um cineasta também negro, Antoine
Fuqua, "Dia de treinamento" na verdade poderia ter sido bem diferente do
produto que acabou nas telas. Antes que Denzel assume o papel do
veterano policial, nomes fortes recusaram a missão: Bruce Willis, Mickey
Rourke, Samuel L. Jackson, Gary Sinise e Tom Sizemore pularam fora do
projeto antes mesmo do início das filmagens, assim como Matt Damon,
Tobey Maguire e até mesmo o rapper Eminem rejeitaram o papel de Jake
Hoyt, o parceiro jovem e ingênuo do nada exemplar protagonista - que, no
roteiro original, deixava claro à plateia as origens de seu
comportamento nocivo, coisa que desapareceu da montagem final definida
pelo romancista policial James Ellroy como "pura perda de tempo". Apesar
dessa crítica nada gentil do autor de "Los Angeles, cidade proibida",
porém, o filme de Fuqua - que já tinha no histórico o visualmente
atraente mas oco de conteúdo "Assassinos substitutos" - cumpre o que
promete: é um thriller intenso e ritmado, com atuações intensas e uma
história interessante o bastante para prender a atenção da primeira à
última cena.
O
filme acompanha o primeiro dia do jovem Jake Hoyt (Ethan Hawke,
indicado ao Oscar de ator coadjuvante) na divisão de narcóticos de Los
Angeles. Seu objetivo é trabalhar no escritório da corporação, mas para
isso ele precisa passar ao menos 24 horas nas ruas da cidade, ao lado do
veterano Alonzo Harris (Denzel Washington exercitando seu lado
arrogante e cínico com visível prazer), que há mais de uma década
frequenta as calçadas dos bairros mais perigosos e violentos. Pai de uma
filha recém-nascida, Hoyt aos poucos começa a perceber que a má fama de
Alonzo não é apenas lenda e testemunha atrocidades que o deixam tão
chocados quanto revoltados: ameaçado de ter sua carreira destruída e sua
família morta se revelar qualquer deslize, ele se vê envolvido em
chantagem, corrupção, tráfico de drogas e homicídio e passa a questionar
suas chances de terminar o dia com vida.
Dirigido com
segurança por Fuqua - que imprime ao filme uma tensão palpável e uma
violência crível que utiliza os clichês do gênero a seu favor - "Dia de
treinamento" é um policial politicamente incorreto, que não tem medo de
retratar latinos e negros como traficantes e vilões, seguindo o caminho
inverso do cinema comercial americano de seu tempo, sempre pisando em
ovos para não se indispor com nenhuma comunidade. Chegando às últimas
consequências em seu desenvolvimento, o roteiro de David Ayer - que se
tornaria especialista em tramas semelhantes nos anos seguintes -
praticamente coloca o espectador no banco de trás do carro de Alonzo,
sentindo na pele todo o drama de Hoyt em sua tentativa de sobreviver ao
pior dia de sua vida. Essa cumplicidade entre plateia e herói é o grande
trunfo do filme - além da atuação de Washington - e o que faz com que
ele se sobressaia a tantas outras produções similares. É um belo
entretenimento, para adultos que buscam diversão longe dos blockbusters
inconsequentes oferecidos por Hollywood.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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