A
PROFESSORA DE PIANO (La pianiste, 2001, Arte France Cinéma/Bavaria Film
International, 131min) Direção: Michael Haneke. Roteiro: Michael
Heneke, romance de Elfried Jelinek. Fotografia: Christian Berger.
Montagem: Nadine Muse, Monika Willi. Figurino: Annette Beaufays. Direção
de arte/cenários: Christoph Kanter/Hans Wagner. Produção executiva:
Yvon Crenn, Christine Gozlan, Michael Katz. Produção: Veit Heiduschka.
Elenco: Isabelle Huppert, Annie Girardot, Benoit Magimel, Susanne
Lothar, Udo Samel. Estreia: 14/5/01 (Festival de Cannes)
O
público que lotou as salas de cinema para assistir ao tenebroso
"Cinquenta tons de cinza" deveria recorrer ao cineasta austríaco Michael
Haneke para entender com mais precisão os confusos desvãos da mente
sadomasoquista. Ao eleger como protagonista uma singela musicista que
mora com a mãe - com quem mantém uma relação de amor e ódio - e que
busca na dor uma válvula de escape para dominar sua solidão e repressão
sexual, o diretor (indicado ao Oscar em 2013 pelo devastador "Amor")
criou polêmica e deu à extraordinária Isabelle Huppert um dos papéis
mais marcantes de sua carreira. Baseado em um livro de Elfried Jelinek,
"A professora de piano" estreou no Festival de Cannes de 2001 e, a
despeito de seu tema controverso, agradou à crítica graças à elegância e
sutileza com que ele foi tratado. Não é um filme para qualquer público -
é lento, inteligente e construído sem exageros, além de ter um final em
aberto que pode incomodar - mas é, inegavelmente, um belíssimo conto
sobre o amor e a obsessão.
Erika Kohut, interpretada
com devastador minimalismo por Isabelle Huppert, é uma professora de
piano solteira e solitária que substituiu uma relação conjugal com a
dedicação a seus alunos, a quem trata com igual frieza e altos níveis de
exigência. Morando com a mãe (Annie Girardot) - o pai está internado em
um manicômio - ela tampouco tem talento suficiente para apresentar-se
em concertos, contentando-se em ser a estrela de recitais domésticos,
onde é aplaudida entusiasticamente pela alta sociedade. Em uma dessas
apresentações ela conhece o jovem Walter Klemmer (Benoit Magimel), um
rapaz cuja paixão pela música não esconde o desejo que passa a sentir
por ela, para seu próprio espanto. O que Walter não sabe é que, por
debaixo da aparente elegância e sofisticação de Erika se esconde uma
mulher torturada por uma luxúria inusitada: sem que ninguém desconfie,
ela frequenta sex-shops para assistir a vídeos pornô, cheira lenços
sujos de sêmen de desconhecidos, pratica automutilação sexual e lida de
forma doentia com a dubiedade de sua vida pessoal.
O
encontro entre Erika e Walter deflagra uma inesperada relação,
desmedida e baseada na rejeição e no desejo reprimido. Incapaz de viver
um relacionamento saudável, a professora se entrega a um jogo de
dominação doentia, a ponto de escrever uma carta com suas exigências ao
jovem candidato a amante, que, pego de surpresa com tamanho detalhismo
põe em dúvida seus próprios sentimentos. Não é de espantar que tanto
Benoit Magimel quanto Isabelle Huppert tenham sido premiados no Festival
de Cannes - de onde o diretor Michael Haneke saiu também com o prêmio
especial do júri. Enquanto Magimel transmite com exatidão toda a
vastidão de sentimentos de um personagem cuja passividade se transforma
em uma raivosa violência no terço final, Huppert entrega uma
interpretação avassaladora como Erika, cujo silêncio e modos reservados
escondem um furacão indomável. Imprevisível e perigosa, a sua professora
de piano é uma das personagens mais psicologicamente complexas que o
cinema já ofereceu, e o trabalho de Isabelle é absolutamente
irretocável, tanto em seu olhar quase vazio quanto em seus momentos de
crueza e maldade - a maneira como lida com uma aluna de quem sente
inveja e ciúme é de arrepiar, assim como a naturalidade com que usa uma
lâmina de barbear para cortar a vagina pouco antes de sentar-se à mesa
para jantar como se nada tivesse acontecido.
É lógico
que os fãs de "Cinquenta tons de cinza" não iriam compreender todo o
alcance psicológico e a densidade dramática de "A professora de piano",
que utiliza o sexo como gatilho para uma série de elocubrações que
passam longe de qualquer superficialidade. Quando Haneke filma cenas
sensuais entre seus personagens não é com a intenção de excitar a
plateia e sim incomodá-la, deixá-la desconfortável e tensa. Seus
objetivos são atingidos com louvor, em sequências nunca menos que
constrangedoras, que afastam qualquer tipo de relação entre sexo e
prazer sem culpa. Só por levantar a questão do sadomasoquismo sem
brincadeiras e sem preconceitos, o cineasta já mereceria aplausos
fervorosos. Por unir a isso a atuação exemplar de Isabelle Huppert sua
obra torna-se obrigatória e imperdível.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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Um comentário:
thank you
سعودي اوتو
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