CÁLCULO
MORTAL (Murder by numbers, 2002, Warner Bros/Castle Rock Entertainment,
115min) Direção: Barbet Schroeder. Roteiro: Tony Gayton. Fotografia:
Luciano Tovoli. Montagem: Lee Percy. Música: Clint Mansell. Figurino:
Carol Oditz. Direção de arte/cenários: Stuart Wurtzel/Hilton Rosemarin.
Produção executiva: Sandra Bullock, Jeffrey Stott. Produção: Richard
Crystal, Susan Hoffman, Barbet Schroeder. Elenco: Sandra Bullock, Ben
Chaplin, Ryan Gosling, Michael Pitt, Agnes Bruckner, Chris Penn.
Estreia: 19/4/02
Se alguém estranhar a presença de
Sandra Bullock no papel principal do suspense policial "Cálculo mortal"
basta dar uma olhada nos créditos de abertura para descobrir que ela é
também um dos produtores executivos do filme de Barbet Schroeder:
somente assim dá pra entender porque a atriz - que até funciona em
comédias românticas ou papéis mais leves mas é incapaz de convencer
interpretando personagens dramáticos (apesar do Oscar inexplicável por
"Um sonho possível" em 2010). Na pele da detetive Cassie Mayweather, uma
mulher traumatizada por um trágico acontecimento no passado que tenta
desvendar o assassinato aparentemente sem motivos de uma jovem
encontrada morta à beira de um rio, Bullock mais uma vez apresenta seu
arsenal de caras, bocas e trejeitos, enfraquecendo uma história já
banhada em clichês. Seu trabalho pouco inspirado só não consegue diluir
totalmente o suspense da trama porque Schroeder consegue tirar leite de
pedra e porque um dos atores jovens do elenco, Ryan Gosling, já
demonstra, em um de seus primeiros filmes, que seu talento em roubar a
cena.
Anos antes de tornar-se um galã requisitado e um
ator dos mais elogiados de sua geração, Gosling chama a atenção pela
intensidade que empresta ao jovem estudante Richard Haywood, cujo
carisma petulante (e os pais milionários) sempre ajudaram a conquistar
qualquer coisa. Por puro tédio e para provar a teoria de que o crime
perfeito existe, ele se une a um colega de escola, Justin Pendleton
(Michael Pitt, sempre estranho), um nerd desajustado e tímido que vê
nele um ídolo e um modelo a ser seguido. Juntos, eles tramam a morte de
uma desconhecida, planejam com antecedência cada passo e, como chave de
ouro, deixam junto ao corpo traços que levam os detetives ao faxineiro
da escola, Ray Feathers (Chris Penn), previamente condenado por agressão
e tráfico de drogas. Quem não compra a solução do caso é Cassy, uma
policial dedicada que desconfia quase obsessivamente de Richard e
desafia seus superiores e seu parceiro, Sam Kennedy (Ben Chaplin), na
tentativa desesperada de provar seu ponto de vista.
O
ponto de partida de "Cálculo mortal" é dos melhores e mais
inspiradores: dois jovens tentando praticar o crime perfeito - algo que
lembra bastante "Festim diabólico", de Alfred Hitchcock, inclusive com
alguns tons homoeróticos não explorados por Schroeder. O problema é que o
roteiro acaba se desviando de sua premissa inicial sempre que passa a
explorar os dramas pessoais de Cassie, fantasmas que não necessariamente
tem conexão com a trama e que servem apenas para frear o ritmo da
narrativa e dar à Sandra Bullock a chance de tentar mostrar-se capaz de
segurar um papel com consistência dramática - o que ela não consegue, a
não ser que se considere uma boa interpretação um trabalho recheado de
esgares nitidamente forçados e gemidos exagerados para demonstrar medo e
fragilidade (coisas que ela fez também em "Gravidade" e pelo qual
conseguiu uma nova indicação ao Oscar). Sempre que a trama muda de foco e
sai da investigação do crime para explorar os dramas pessoais de
Cassie, o filme cai perigosamente no tédio e no lugar-comum, que culmina
com a protagonista dormindo com o colega de trabalho apenas para
mostrar que é descolada e independente. Mais chavão impossível.
Interpretado por Sandra Bullock, então, chega às raias do insuportável.
Felizmente
há mais elementos em "Cálculo mortal" do que sua mocinha sonolenta. O
plano criado pelos dois rapazes é empolgante e a relação entre eles,
ainda que pouco aprofundada pelo roteiro, é muito mais interessante do
que o drama da policial que os investiga. Além do mais, Schroeder -
diretor de filmes de prestígio como "O reverso da fortuna" e de sucessos
de bilheteria como "Mulher solteira procura..." - é um cineasta
inteligente, que tenta, mesmo quando o roteiro não lhe permite, contar
suas histórias de forma a manter o interesse da plateia até o último
minuto. Aqui, há inclusive uma reviravolta final, que, mesmo não sendo
genial, consegue surpreender e livrar o espectador da sensação de tempo
perdido. Pode não ser inesquecível, mas é um filme policial decente e
que cumpre o que promete. Apesar de Sandra Bullock.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
sábado
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