sábado

O ABRIGO

O ABRIGO (Take shelter, 2011, Hydraulx/REI Capital/Grove Hill Productions, 121min) Direção e roteiro: Jeff Nichols. Fotografia: Adam Stone. Montagem: Parke Gregg. Música: David Wingo. Figurino: Karen Malecki. Direção de arte/cenários: Chad Keith/Adam Willis. Produção executiva: Sarah Green, Brian Kavanaugh-Jones, Christos Konstantakopoulos, Chris Perot, Richard Rothfeld, Colin Strause, Gregg Strause. Produção: Tyler Davidson, Sophia Lin. Elenco: Michael Shannon, Jessica Chastain, Kathy Baker, Tova Stewart, Shea Whigham. Estreia: 24/01/11 (Festival de Sundance)

Por sua atuação em "Foi apenas um sonho", de 2008, o ator Michael Shannon recebeu uma inesperada indicação ao Oscar de coadjuvante - que perdeu para a incensada atuação de Heath Ledger em "Batman, o cavaleiro das trevas". Foi três anos depois, porém, que ele entregou o mais intenso e impressionante desempenho de sua carreira (até hoje): em "O abrigo", suspense dramático dirigido por Jeff Nichols - cineasta independente com quem ele já havia trabalhado anteriormente em "Separados pelo sangue" - Shannon conduz o espectador a um claustrofóbico pesadelo familiar, utilizando-se, para isso, somente de seu superlativo talento e de um roteiro enxuto, conciso e que se recusa a entregar soluções óbvias. A anos-luz de distância de um filme de suspense convencional, a obra de Nichols depende da capacidade do público de envolver-se em uma trama de viés mais psicológico que físico, mas premia aos corajosos com uma história intrigante, que prende a atenção da primeira à última cena - graças, também, à participação da sempre excelente Jessica Chastain.

De estrutura simples e desenvolvimento suave, "O abrigo" centra seu foco em Curtis (interpretado com precisão cirúrgica por Shannon), um homem aparentemente comum, operário da construção civil de uma pequena cidade da zona rural de Ohio, casado com a bela e compreensiva Samantha (Jessica Chastain) e pai de uma adorável menina com deficiência auditiva. A tranquilidade de sua vida, porém, é apenas superficial, já que, internamente, Curtis passa por um turbilhão desesperador: do nada, ele passa a ter alucinações visuais e auditivas que o fazem acreditar em uma possível - e iminente - tormenta de proporções apocalípticas. Além disso, pesadelos bastante reais o levam a afastar-se da família e do melhor amigo e colega de trabalho. Ciente das possibilidades de uma doença mental congênita - já que sua mãe vive em um hospital psiquiátrico, diagnosticada como esquizofrênica - Curtis procura tratamento, mas aos poucos as coisas começam a fugir de seu controle, a ponto de dar a ele a ideia de reformar um abrigo anti-nuclear que mantém no quintal de sua casa.


Evitando sustos baratos e seguindo o caminho mais difícil - e inteligente - da sugestão, o roteiro de Jeff Nichols caminha com ritmo próprio, apresentando aos poucos todos os desdobramentos de sua trama, que é bem mais complexa do que aparenta em um primeiro vislumbre. Mais do que questionar se seu protagonista é alguém dotado de sensibilidade extrassensorial ou apenas um homem em vias de um violento colapso mental, Nichols investiga também sua dinâmica familiar e a forma como ela se altera conforme sua sanidade vai sendo minada por suas tétricas visões. Essa caminhada rumo à loucura - ou será que as visões são realmente avisos de uma hecatombe próxima? - é pavimentada por um visual seco e direto, pincelado aqui e acolá com efeitos visuais discretos mas eficazes e uma trilha sonora pontual, que sublinha os momentos de maior intensidade da trama. Essa intensidade toda, no entanto, seria bem menor não fosse a atuação irrepreensível de Michael Shannon.

Apoiado pelo desempenho discreto e sensível de Jessica Chastain, Shannon empresta à Curtis uma força que vai se avolumando no decorrer da narrativa, se equilibrando com maestria entre oásis de tranquilidade e furacões de angústia - como a sensacional sequência em um jantar com a comunidade local, em que o protagonista explode quando pressionado pelas circunstâncias e mostra a todos a dimensão de seu desespero. Se alguém ainda tinha dúvidas a respeito do talento do ator até então, se vê diante de uma interpretação das mais intensas e corajosas, capaz de segurar um filme inteiro nas costas e fazer com que qualquer um acredite na sua verdade. Uma performance impecável em um filme raro, daqueles que melhoram a cada revisão. Imperdível!

Nenhum comentário:

JADE

  JADE (Jade, 1995, Paramount Pictures, 95min) Direção: William Friedkin. Roteiro: Joe Eszterhas. Fotografia: Andrzej Bartkowiak. Montagem...