MEDIANERAS (Medianeras, 2011, INCAA, 95min) Direção e roteiro: Gustavo Taretto. Fotografia: Leandro Martínez. Montagem: Pablo Mari, Rosario Suárez. Música: Gabriel Chwojnick. Figurino: Flavia Gaitán. Direção de arte/cenários: Romeo Fasce, Luciana Quartaruolo. Produção executiva: Bárbara Francisco, Christoph Friedel, Luis Miñarro. Produção: Natacha Cervi, Hernán Musaluppi. Elenco: Javier Drolas, Pilar López de Ayala, Inês Efron, Adrián Navarro. Estreia: 02/11 (Festival de Berlim)
Em "Sob o céu de Saigon", conto do escritor gaúcho Caio Fernando Abreu, duas personagens que não se conhecem mas que são
nitidamente almas gêmeas cruzam uma pela outra em uma rua qualquer e não
se reconhecem, não trocando nem ao menos duas palavras. Pois foi esse
conto genial de Caio que vem à cabeça enquanto se assiste à
"Medianeras", mais um excelente exemplo do cinema argentino a aportar no
Brasil. A diferença entre o conto e o filme é que, enquanto nas
páginas poéticas de Abreu a solidão acaba saindo vencedora, nas imagens
do roteirista e cineasta Gustavo Taretto o amor e a esperança é que são
vitoriosos.
Os dois protagonistas de "Medianeras" são bastante solitários e um tanto
quanto complicados. Martin (Javier Drolas) é um criador de websites que
vive isolado em um apartamento minúsculo de Buenos Aires, tendo a
companhia apenas da cachorrinha que herdou de um namoro interrompido.
Hipocondríaco e praticamente um misantropo, ele baseia suas relações
praticamente através da Internet. Já Mariana (Pilar López de Ayala)
acaba de sair de um relacionamento frustrante de quatro anos e não se
sente pronta para recomeçar a vida, preferindo a companhia dos manequins
plásticos que fazem parte de seu trabalho como vitrinista (uma vez que a
carreira de arquiteta ficou apenas no diploma). Tanto um quanto o outro
sentem que a solidão não é exatamente um caminho saudável a seguir, mas
também são incapazes de lidar com o mundo a seu redor. Ele só compra,
ouve música, vê filmes e se relaciona através do computador. Ela se
sente perdida no mundo, procurando algo que nem mesmo sabe o que é, em
um interessante paralelo com os livros infantis "Onde está Wally?" ("se
não encontro nem mesmo alguém que eu sei exatamente quem é, como poderei
encontrar alguém que eu nem conheço?", ela se pergunta, frustrada). O
que eles não sabem, porém, é que são vizinhos, que moram na mesma rua, e
que várias vezes se cruzaram pelas calçadas, sem perceber um ao outro.
"Medianeras" é um estudo sobre solidão, sobre as benesses e os problemas
de tecnologia (que afasta as pessoas enquanto deveria uní-las), sobre o
crescimento desenfreado das grandes cidades, sobre as dificuldades
humanas em se comunicar. Mas, ao contrário do que pode parecer, não é um
drama pesado e denso, capaz de estragar o humor do espectador. Taretto
cria, em seu roteiro, uma sucessão de cenas agradáveis, equilibrando
alguns momentos de graças sutil com outros da mais pura e honesta
melancolia. Sua forma criativa de contar a história de amor entre Martin
e Mariana ainda encontra espaço para digressões filosóficas pertinentes
e jamais aborrecidas, que questiona principalmente a vida nos grandes
centros - que isola e oprime seus cidadãos - e a aparente
impossibilidade de uma felicidade real.
Mas, acima de tudo, "Medianeras" é um belo filme sobre a esperança e
sobre como a felicidade pode estar ao alcance dos olhos quando se presta
atenção a seu redor. E além do mais, é impossível não se encantar com
um filme que homenageia explicitamente "Manhattan", um Woody Allen dos
melhores. É de sair do cinema (ou desligar o aparelho de dvd) com um largo sorriso estampado no rosto.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
sexta-feira
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