7 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (David O. Russell), Roteiro Original, Ator Coadjuvante (Christian Bale), Atriz Coadjuvante (Amy Adams/Melissa Leo), Montagem
Vencedor de 2 Oscar: Ator Coadjuvante (Christian Bale), Atriz Coadjuvante (Melissa Leo)
Vencedor de 2 Golden Globes: Ator Coadjuvante (Christian Bale), Atriz Coadjuvante (Melissa Leo)
“O vencedor” não é apenas o primeiro
da série de três filmes do cineasta David O. Russell que conquistou a Academia
de Hollywood a ponto de chegarem a concorrer aos Oscar de filme, direção e
roteiro: é, também, o que melhor soube se aproveitar do estilo despojado e
espontâneo do diretor, depois tornado regra e, consequentemente, diluído nos
bastante inferiores “O lado bom da vida” (12) e “Trapaça” (13). Baseado no
drama real do lutador de boxe Dicky Ecklund – uma lenda em sua comunidade e que
viu sua carreira escorrer pelo ralo graças ao vício em heroína – o filme de
Russell faz uso inteligente das atuações viscerais e orgânicas de seu elenco
principal (seu principal destaque) ao contar uma história onde o esporte divide
espaço com as relações familiares de um clã tão disfuncional e problemático
quanto interesseiro. Deixando sua câmera circular por um ambiente suburbano
quase palpável em sua decadência, o cineasta acerta no registro que beira o
documental, mas peca em deixar que tanta liberdade atrapalhe o ritmo da
narrativa. No fim das contas, “O vencedor” é um filme acima da média, mas
bastante irregular.
Um diretor adepto do naturalismo – o
que contraria a condução de seu trabalho mais conhecido até então, a comédia de
guerra “Três reis” (00), realizada dentro dos padrões mais tradicionais do
gênero – Russell frequentemente deixa que o trabalho de seus atores comande a
dinâmica das cenas de seus filmes, e tal tendência fica extremamente clara em
“O vencedor”, uma obra totalmente calcada em seus (ótimos) atores e que em
determinados momentos sofre de uma evidente fragilidade de estrutura dramática.
A opção estética de Russell em tratar sua história em forma semi-documental
remete à maior das obras-primas sobre o mundo do boxe, o brilhante “Touro
indomável” (80), de Martin Scorsese (que também privilegia a energia dos atores
em detrimento de um andamento mais convencional), mas é covardia comparar os
dois filmes: enquanto Scorsese mergulha fundo na alma e nos demônios de Jake La
Motta (interpretação inesquecível de Robert DeNiro), Russell prefere se manter
à margem dos dramas de seu protagonista – que surpreendentemente, não é Dicky
Ecklund, e sim seu irmão mais jovem, Micky Ward, interpretado com segurança por
Mark Wahlberg – como uma espécie de voyeur
de luxo. É inegável que tal opção combina com seus métodos de direção, mas
também é flagrante que é somente em alguns (raros) momentos em que se permite
um pouco mais de emoção que o filme realmente conquista seu público.
Na maior parte do tempo “O vencedor”
acompanha a complicada tentativa de Micky em tornar-se um campeão de boxe, a
despeito da pressão exercida sobre ele por sua mãe, a ambiciosa e por vezes
cruel Alice (Melissa Leo) e pelo resto de sua família – um grupo de irmãs
cafonas e histéricas e seu patético irmão mais velho, Dicky, que passa os dias
enchendo o organismo de drogas enquanto relembra um passado que considera
glorioso. Considerando-se os donos de Micky, Dicky e Alice armam uma cruzada
impiedosa contra sua nova namorada, Charlene (Amy Adams), uma garçonete que não
tem medo de enfrentar a corja que cerca o rapaz e o conduz em direção ao
sucesso no esporte. Dividindo seu tempo entre as brigas entre os dois lados da
questão (com muita gritaria, tapas e desaforos) e as batalhas de Micky dentro
dos ringues, “O vencedor” flui sem maiores problemas – graças à edição
competente também indicada ao Oscar – mas poucas vezes chega a realmente
encantar. Para sorte de Russell, seu elenco se responsabiliza por segurar (e
muito bem) as pontas.
Na pele de Charlene, Amy
Adams foi indicada à estatueta de coadjuvante feminina, mas perdeu para sua
colega de cena Melissa Leo, que rouba a cena sempre que surge na pele da
peruíssima e desagradável Alice. Brilhante, Leo teve sua vitória contestada
devido à feroz campanha feita por ela junto aos membros eleitores – algo não
exatamente proibido pelas regras da Academia, mas no mínimo constrangedor –
porém é difícil não reconhecer sua entrega ao papel, especialmente quando precisa
fazer frente à interpretação impecável de Christian Bale, que levou o Oscar de
ator coadjuvante. Macérrimo na pele de Dicky, o ator inglês confirma com sua
atuação o que todo mundo já conseguia antever desde sua estreia aos onze anos
de idade, em “Império do sol” (87): o fato de que, por trás de sua tão falada
arrogância (que o digam os técnicos agredidos por ele nas filmagens de “O
exterminador do futuro 4”), existe um ator excepcional, capaz de equilibrar
grandes produções comerciais como a trilogia do Batman dirigida por Christopher
Nolan com obras menos imponentes e centradas em personagens mais próximos da
realidade. A cena em que Melissa e Bale abrem seus corações cantando “I started
a joke” é um exemplo perfeito de como “O vencedor” poderia ter sido ainda
melhor se lhe tivesse sido permitido ser mais emocional do que racional.
Para os fãs de boxe “O vencedor” não
irá decepcionar – as lutas são bem filmadas, ainda que não cheguem perto da
energia de outros filmes com a mesma temática, como “Rocky, um lutador” (76) e
“Menina de ouro” (04). Mas é um filme indeciso entre abraçar o lado emotivo de
sua história ou focar na glória (ou na decadência) de um esporte cujas
possibilidades dramáticas são imensas. Ficando no meio-termo acaba por tornar-se
apenas mais um dentre muitos, a despeito de sua calorosa receptividade junto à
Academia – que, além dos prêmios de Leo e Bale, ainda lhe indicou às estatuetas
de filme, direção, roteiro, atriz coadjuvante (Amy Adams) e edição. Um exagero
que o tempo há de deixar ainda mais explícito, apesar das qualidades do filme.
Um comentário:
Preciso ver esse filme!
Ótimo texto e blog!
Passei a seguir ok?
Grande abraço.
- André Betioli
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