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O VENCEDOR

O VENCEDOR (The fighter, 2010, Closest to the bone Productions, 116min) Direção: David O. Russell. Roteiro: Scott Silver, Paul Tamasy, Eric Johnson, estória de Paul Tamasy, Eric Johnson, Keith Dorrington. Fotografia: Hoyte Van Hoytema. Montagem: Pamela Martin. Música: Michael Brook. Figurino: Mark Bridges. Direção de arte/cenários: Judy Becker/Gene Serdena. Produção executiva: Darren Aronofsky, Keith Dorrington, Eric Johnson, Tucker Tooley, Leslie Varrelman, Bob Weinstein, Harvey Weinstein. Produção: Dorothy Aufiero, David Hoberman, Ryan Kavanaugh, Todd Lieberman, Paul Tamasy, Mark Wahlberg. Elenco: Mark Wahlberg, Christian Bale, Amy Adams, Melissa Leo. Estreia: 10/12/10

7 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (David O. Russell), Roteiro Original, Ator Coadjuvante (Christian Bale), Atriz Coadjuvante (Amy Adams/Melissa Leo), Montagem
Vencedor de 2 Oscar: Ator Coadjuvante (Christian Bale), Atriz Coadjuvante (Melissa Leo)
Vencedor de 2 Golden Globes: Ator Coadjuvante (Christian Bale), Atriz Coadjuvante (Melissa Leo)


          “O vencedor” não é apenas o primeiro da série de três filmes do cineasta David O. Russell que conquistou a Academia de Hollywood a ponto de chegarem a concorrer aos Oscar de filme, direção e roteiro: é, também, o que melhor soube se aproveitar do estilo despojado e espontâneo do diretor, depois tornado regra e, consequentemente, diluído nos bastante inferiores “O lado bom da vida” (12) e “Trapaça” (13). Baseado no drama real do lutador de boxe Dicky Ecklund – uma lenda em sua comunidade e que viu sua carreira escorrer pelo ralo graças ao vício em heroína – o filme de Russell faz uso inteligente das atuações viscerais e orgânicas de seu elenco principal (seu principal destaque) ao contar uma história onde o esporte divide espaço com as relações familiares de um clã tão disfuncional e problemático quanto interesseiro. Deixando sua câmera circular por um ambiente suburbano quase palpável em sua decadência, o cineasta acerta no registro que beira o documental, mas peca em deixar que tanta liberdade atrapalhe o ritmo da narrativa. No fim das contas, “O vencedor” é um filme acima da média, mas bastante irregular.
 Um diretor adepto do naturalismo – o que contraria a condução de seu trabalho mais conhecido até então, a comédia de guerra “Três reis” (00), realizada dentro dos padrões mais tradicionais do gênero – Russell frequentemente deixa que o trabalho de seus atores comande a dinâmica das cenas de seus filmes, e tal tendência fica extremamente clara em “O vencedor”, uma obra totalmente calcada em seus (ótimos) atores e que em determinados momentos sofre de uma evidente fragilidade de estrutura dramática. A opção estética de Russell em tratar sua história em forma semi-documental remete à maior das obras-primas sobre o mundo do boxe, o brilhante “Touro indomável” (80), de Martin Scorsese (que também privilegia a energia dos atores em detrimento de um andamento mais convencional), mas é covardia comparar os dois filmes: enquanto Scorsese mergulha fundo na alma e nos demônios de Jake La Motta (interpretação inesquecível de Robert DeNiro), Russell prefere se manter à margem dos dramas de seu protagonista – que surpreendentemente, não é Dicky Ecklund, e sim seu irmão mais jovem, Micky Ward, interpretado com segurança por Mark Wahlberg – como uma espécie de voyeur de luxo. É inegável que tal opção combina com seus métodos de direção, mas também é flagrante que é somente em alguns (raros) momentos em que se permite um pouco mais de emoção que o filme realmente conquista seu público.


Na maior parte do tempo “O vencedor” acompanha a complicada tentativa de Micky em tornar-se um campeão de boxe, a despeito da pressão exercida sobre ele por sua mãe, a ambiciosa e por vezes cruel Alice (Melissa Leo) e pelo resto de sua família – um grupo de irmãs cafonas e histéricas e seu patético irmão mais velho, Dicky, que passa os dias enchendo o organismo de drogas enquanto relembra um passado que considera glorioso. Considerando-se os donos de Micky, Dicky e Alice armam uma cruzada impiedosa contra sua nova namorada, Charlene (Amy Adams), uma garçonete que não tem medo de enfrentar a corja que cerca o rapaz e o conduz em direção ao sucesso no esporte. Dividindo seu tempo entre as brigas entre os dois lados da questão (com muita gritaria, tapas e desaforos) e as batalhas de Micky dentro dos ringues, “O vencedor” flui sem maiores problemas – graças à edição competente também indicada ao Oscar – mas poucas vezes chega a realmente encantar. Para sorte de Russell, seu elenco se responsabiliza por segurar (e muito bem) as pontas.
Na pele de Charlene, Amy Adams foi indicada à estatueta de coadjuvante feminina, mas perdeu para sua colega de cena Melissa Leo, que rouba a cena sempre que surge na pele da peruíssima e desagradável Alice. Brilhante, Leo teve sua vitória contestada devido à feroz campanha feita por ela junto aos membros eleitores – algo não exatamente proibido pelas regras da Academia, mas no mínimo constrangedor – porém é difícil não reconhecer sua entrega ao papel, especialmente quando precisa fazer frente à interpretação impecável de Christian Bale, que levou o Oscar de ator coadjuvante. Macérrimo na pele de Dicky, o ator inglês confirma com sua atuação o que todo mundo já conseguia antever desde sua estreia aos onze anos de idade, em “Império do sol” (87): o fato de que, por trás de sua tão falada arrogância (que o digam os técnicos agredidos por ele nas filmagens de “O exterminador do futuro 4”), existe um ator excepcional, capaz de equilibrar grandes produções comerciais como a trilogia do Batman dirigida por Christopher Nolan com obras menos imponentes e centradas em personagens mais próximos da realidade. A cena em que Melissa e Bale abrem seus corações cantando “I started a joke” é um exemplo perfeito de como “O vencedor” poderia ter sido ainda melhor se lhe tivesse sido permitido ser mais emocional do que racional. 

Para os fãs de boxe “O vencedor” não irá decepcionar – as lutas são bem filmadas, ainda que não cheguem perto da energia de outros filmes com a mesma temática, como “Rocky, um lutador” (76) e “Menina de ouro” (04). Mas é um filme indeciso entre abraçar o lado emotivo de sua história ou focar na glória (ou na decadência) de um esporte cujas possibilidades dramáticas são imensas. Ficando no meio-termo acaba por tornar-se apenas mais um dentre muitos, a despeito de sua calorosa receptividade junto à Academia – que, além dos prêmios de Leo e Bale, ainda lhe indicou às estatuetas de filme, direção, roteiro, atriz coadjuvante (Amy Adams) e edição. Um exagero que o tempo há de deixar ainda mais explícito, apesar das qualidades do filme.

Um comentário:

Unknown disse...

Preciso ver esse filme!
Ótimo texto e blog!

Passei a seguir ok?

Grande abraço.

- André Betioli

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