OS NORMAIS, O FILME (Os Normais - O Filme, 2003, Globo Filmes, 110min) Direção: José Alvarenga Jr.. Roteiro: Alexandre Machado, Fernanda Young, Jorge Furtado. Fotografia: Tuca Moraes. Montagem: Paulo Henrique Farias. Figurino: Lessa de Lacerda. Direção de arte: Lia Renha. Produção executiva: Eduardo Figueira. Produção: Carlos Eduardo Rodrigues. Elenco: Fernanda Torres, Luiz Fernando Guimarães, Marisa Orth, Evandro Mesquita, Tutuca, Lupe Gigliotti. Estreia: 24/10/03
Exibida semanalmente na TV Globo entre 2001 e 2003, a série "Os normais" mostrava o dia-a-dia de um casal de noivos aparentemente comuns mas que escondiam, em sua rotina, toda série de neuroses e paranoias possíveis e imagináveis. Escritos pelo casal Alexandre Machado e Fernanda Young - e ocasionalmente por outros nomes respeitados da dramaturgia nacional, como Jorge Furtado - os 71 episódios foram dirigidos por José Alvarenga Jr. e estrelados pela dupla Luiz Fernando Guimarães e Fernanda Torres, que ficaram marcados no imaginário popular como o certinho Rui e a tresloucada Vani, que conquistaram um público fiel e apaixonado. Não foi surpresa, portanto, quando foi anunciado que, da telinha pequena, os dois ganhariam a telona do cinema, na transposição do seriado para o cinema. Dirigido pelo mesmo Alvarenga e escrito pelos mesmos Machado, Young e Jorge Furtado, "Os Normais, o filme", estreou logo após o último episódio ir ao ar e confirmou o que todos esperavam: um enorme sucesso de bilheteria, com mais de três milhões de espectadores. A despeito do êxito comercial, porém, não fugiu da percepção de ninguém que o filme incorria no mesmo erro de várias outras adaptações televisivas para o cinema: é uma comédia engraçadíssima, com um elenco irretocável, mas no fundo, no fundo, é apenas mais um episódio alongado - e, com a liberdade do novo meio de comunicação, repleto de palavrões e situações impensáveis para um programa familiar.
Para os fãs, porém, o fato de o filme não se arriscar em inovar no novo formato, não incomoda em nada. Todas as qualidades que "Os normais" tinha na tv se repete no cinema, expandidas e sem cortes: estão presentes os diálogos de duplo sentido (que funcionam principalmente graças ao carisma impressionante de Fernanda Torres), as observações sagazes a respeito do modo de vida comum das pessoas de classe média, o humor politicamente incorreto e até mesmo algum humor de gosto duvidoso e quase infantil, o que, apesar do linguajar sem meios tons dos personagens, agrada até mesmo uma plateia menos adulta. "Os normais" tem a seu favor a despretensão em agradar intelectualmente, se propondo unicamente a entreter e fazer rir, sem elocubrações filosóficas ou sociais. O humor de Machado e Young é direto, sem anestesia, quase pueril em sua construção, mas paradoxalmente dotado de uma sofisticação pop, repleto de referências e piadas que remetem à sua própria bagagem de espectadores vorazes de telenovelas, seriados, música e literatura dos anos 70 e 80. Justamente essa bagagem - que pode passar despercebida pelo espectador menos antenado - é que diferencia seu texto (não só em "Os normais", mas em outros seriados, como "Os Aspones" e "Macho Man") das dezenas de outros menos bem-sucedidos. E é isso, também, que separa o filme de Alvarenga das comédias populares que vieram em seu rastro, dotadas de um humor histérico e vulgar - o que não foi impedimento para que também se tornassem êxitos de bilheteria.
Ao contrário da série de TV, em que Rui e Vani já são noivos há quase uma década, o filme segue a tendência hollywoodiana de prequels - tramas que mostram a origem de histórias já conhecidas. Quando o filme começa, os protagonistas são noivos, sim, mas de outras pessoas e se conhecem no dia de seus casamentos: Rui é noivo de Marta (Marisa Orth), uma mulher controladora e antipática que se recusa a dividir o arroz que vai ser jogado no casal após a cerimônia, o que incorre na ira de Vani, que vai se casar imediatamente antes com Sérgio (Evandro Mesquita), um homem pacato e aparentemente apaixonado. O conflito entre as duas noivas e as confusões que advem dessa briga domina a primeira parte da obra - com direito a um hilariante desfile de Vani pelas ruas cariocas em uma anacrônica carruagem. A segunda metade do filme começa quando, chegando ao apartamento onde vai morar com Sérgio, Vani descobre que foi traída na noite anterior à cerimônia. Furiosa, ela acaba envolvendo Rui e Marta na confusão - principalmente porque eles irão morar em um apartamento no prédio em frente e porque revelações inesperadas os colocarão - a todos - na mesma bagunça.
É impossível não rir em "Os normais". O roteiro atira para todos os lados, com todos os tipos de humor, e sai-se bem em quase todos (talvez o excesso de palavrões seja um tanto incômodo, mais pela gratuidade do que por pruridos morais). Fernanda Torres conduz a narrativa de forma absoluta, imprimindo à sua Vani uma personalidade que muito tem da própria atriz e da criadora Fernanda Young, além de confirmar o timing cômico impecável com que brindou o espectador durante os três anos da série. Luiz Fernando Guimarães continua rindo das próprias piadas, o que enfraquece consideravelmente sua graça e Marisa Orth e Evandro Mesquita (que já haviam participado da série em outros papéis) pontuam com correção o show de Fernandinha, que marcou sua carreira para sempre com sua atuação - fato um tanto imprevisível para uma atriz que ganhou a Palma de Ouro em Cannes com apenas 20 anos de idade.
Sucesso absoluto de público - e surpreendentemente de crítica, normalmente avessa às transições de mídia - "Os normais" ainda ganhou uma continuação em 2009, com o subtítulo "A noite mais maluca de todas". Definitivamente, Rui e Vani tem uma vasta legião de fãs.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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Um comentário:
Pensando no que comentar, já que é tanta coisa que eu falaria e que eu já falei pra ti. Imagino pra escrever o post :p
Mas algo que eu percebi... Tentaram colocar um pouco dessa "elocubração filosófica" no 2º filme e aumentaram a comédia pastelão/idiota/estilo-rui, e isso pra mim não funcionou.
Mas quanto ao filme ser um episódio alongado, também não me importo.
;)
Bjoooooo
zukm.t
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