O
HOMEM QUE NÃO ESTAVA LÁ (The man who wasn't there, 2001, Gramercy
Pictures/Good Machine, 116min) Direção: Joel Coen. Roteiro: Ethan Coen,
Joel Coen. Fotografia: Roger Deakins. Montagem: Roderick Jaynes, Tricia
Cooke. Música: Carter Burwell. Figurino: Mary Zophres. Direção de
arte/cenários: Dennis Gassner/Chris Spellman. Produção executiva: Tim
Bevan, Eric Fellner. Produção: Ethan Coen. Elenco: Billy Bob Thornton,
Frances McDormand, James Gandolfini, Michael Badalucco, Jon Polito,
Katherine Borowitz, Scarlett Johansson, Richard Jenkins, Tony Shalhoub.
Estreia: 13/5/01 (Festival de Cannes)
Indicado ao Oscar de Fotografia
A
estreia dos irmãos Coen em 1984 - o inteligente "Gosto de sangue", que
os revelou à crítica como a grande promessa da década - era uma
releitura moderna do filme noir, gênero caríssimo do cinema
norte-americano. A partir de então, os cineastas entraram em uma jornada
artística que virou do avesso a comédia, os filmes de gângsteres e os
filmes musicais e policiais com doses generosas de humor negro e um
qualidade narrativa que encantou os espectadores, sempre confiantes de
que, sob sua assinatura, histórias sempre criativas e elegantes fazem a
diferença na mesmice do cinemão comercial hollywoodiano. Outro exemplo
dessa afirmação é o contemplativo "O homem que não estava lá", belíssimo
drama policial que revisita o noir com ainda mais propriedade de seu
primeiro filme. Em um hipnotizante preto-e-branco de Roger Deakins
(filmado em cores e depois alterado para maior efeito dramático) e com
uma atuação inspiradíssima de Billy Bob Thornton no papel central, a
história de traição, morte e desenganos criada pelos cineastas é um dos
mais bem-acabados trabalhos de sua carreira até então - o que não é
pouco para quem criou pérolas como "Fargo" (96) e "E aí, meu irmão, cadê
você?" (00).
Passado em uma cidade do interior da
Califórnia em 1949, "O homem que não estava lá" conta a história de Ed
Crane (Billy Bob Thornton), que leva um dia-a-dia tedioso trabalhando na
barbearia do cunhado Frank (Michael Badalucco) enquanto examina
silenciosamente a vida se desenrolando à sua volta. Um dia, por acaso,
ele se vê tentado a investir em um negócio de lavagem a seco e, para
conseguir os dez mil dólares necessários para a sociedade, passa a
chantagear o empresário Big Dave Brewster (James Gandolfini), chefe e
amante de sua mulher, Doris (Frances McDormand). Sua chantagem acaba
tragicamente com a morte de Big Dave e sua vida se transforma em um
pesadelo surreal quando Doris é presa pelo crime. Sabendo da verdade
sobre o assassinato mas sem poder provar, Crane se vê envolvido em uma
trama que mistura advogados melodramáticos, uma viúva que acredita que
uma invasão extra-terrestre matou seu marido e Birdy (Scarlett
Johansson), uma adolescente que, através de sua música, seduz o durão e
silencioso barbeiro.
Usando
com maestria uma das maiores características do cinema noir - a
narração em off - "O homem que não estava lá" é construído
brilhantemente em todos os seus detalhes visuais e dramáticos,
oferecendo ao público um filme elegante e sério, repleto de camadas
dramáticas e desdobramentos inesperados que são tirados de letra por um
elenco espetacular. Billy Bob Thornton, que no mesmo ano viveu um
assaltante de bancos falastrão em "Vida bandida", de Barry Levinson, dá
um show na pele de Ed Crane, um homem tão lacônico quanto
psicologicamente violento que resolve o turbilhão de sua existência com a
mesma expressão de paisagem que utiliza quando corta o cabelo de seus
clientes. Frances McDormand mais uma vez comprova a extensão de seu
talento na pele da infiel esposa de Crane, com uma interpretação também
minimalista e delicada e James Gandolfini não se deixa eclipsar por seus
colegas e cria uma espécie de vilão com a gama de nuances que fez sua
fama na série de TV "A família Soprano". Seguindo um roteiro preciso e
econômico, eles são os responsáveis por dar credibilidade a uma trama
recheada de reviravoltas rocambolescas e inusitadas.
Com
sequências milimetricamente elaboradas para encantar os olhos do
espectador - não à toa sua fotografia concorreu ao Oscar da categoria -
"O homem que não estava lá" é mais um grande filme dos irmãos Coen:
inteligente, forte, plasticamente deslumbrante e dirigido com firmeza.
Talvez seja mais lento do que o público esteja acostumado, mas tem
qualidades mais do que suficientes para neutralizar seu ritmo pouco ágil
- que, diga-se de passagem, é extremamente apropriado à narrativa
ambicionada pelos cineastas. Um filme que Humphrey Bogart protagonizaria
sem hesitação.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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