A HORA DA ZONA MORTA (Dead zone, 1983, Dino de Laurentiis Company, 103min) Direção: David Cronenberg. Roteiro: Jeffrey Boam, romance de Stephen King. Fotografia: Mark Irwin. Montagem: Ronald Sanders. Música: Michael Kamen. Figurino: Olga Dimitrov. Direção de arte/cenários: Carol Spier/Tom Coulter. Produção: Debra Hill. Elenco: Christopher Walken, Brooke Adams, Martin Sheen, Tom Skerrit, Colleen Dewhurst, Nicholas Campbell, Herbert Lom. Estreia: 21/10/83
Stephen King começou a firmar-se como um nome quente dentro da indústria hollywoodiana quando o sucesso de bilheteria de "Carrie, a estranha" (76), de Brian DePalma e o prestígio de "O iluminado" (80), de Stanley Kubrick comprovaram que por trás de uma boa história de terror poderia haver inteligência e criatividade. Por isso não deixou de ser surpreendente quando o nome do canadense David Cronenberg foi anunciado como o diretor de "A hora da zona morta", mais um romance de King a ser adaptado para as telas no início da década de 80: conhecido por filmes pouco afeitos à sutilezas, como os polêmicos "Enraivecida, na fúria do sexo" (77) e "Scanners, sua mente pode destruir" (81), o cineasta acabou por convencer até mesmo o mais pessimista fã do escritor, porém, quando sua adaptação finalmente foi lançada, no final de 1983. Não só a trama chegou às telas da forma mais fiel possível como Cronenberg conseguiu imprimir a ela uma personalidade e um suspense que funcionam em todos os níveis. Estrelado pelo sempre sinistro Christopher Walken - já oscarizado pelo soldado neurótico de "O franco-atirador" (78) - o filme mantém a atenção da plateia desde seu início angustiante até suas climáticas cenas finais, além de contar uma história recheada o suficiente de ganchos e personagens interessantes.
Walken - em papel que King queria que fosse de Bill Murray, veja só - interpreta Johnny Smith, um professor de inglês de Castle Rock, uma pequena cidade do Maine (que se tornaria cenário preferido de várias histórias de Stephen King a partir de então). Em uma noite chuvosa qualquer, ele deixa sua noiva, Sarah (Brooke Adams), em casa e sofre um grave acidente de carro que o deixa em coma profundo por cinco anos. Depois de acordar - e perceber que sua vida não tem mais condições de ser a mesma, uma vez que Sarah já está casada com outro homem e é mãe de um bebê - Johnny descobre ainda que sua situação lhe presenteou com o estranho dom da clarividência: ao tocar nas pessoas, ele tem o poder de descobrir coisas tais como um incêndio na casa de uma enfermeira, a verdade sobre o desaparecimento da mãe de seu médico (perdida desde a II Guerra Mundial) e, mais importante ainda, é procurado pelo xerife (Tom Skerrit) para ajudar na busca de um assassino serial. Tamanha pressão o acaba levando a esconder-se de todos os que conhece, até que seu caminho se cruza com Greg Stillson (Martin Sheen), um político popular que é candidato ao Senado e pode não ser tão honesto quanto deseja parecer.
Realmente, para quem conhece a obra de David Cronenberg - que posteriormente ainda cometeria filmes que causaram extrema controvérsia, como "Mistérios e paixões" (91) e "Crash, estranhos prazeres" (96) - seu trabalho em "A hora da zona morta" chega a ser convencional. Sem nunca abrir mãos das convenções de um gênero tão pouco aberto a inovações narrativas, o cineasta mantém o interesse do público apostando suas fichas na atuação na medida exata de Christopher Walken, cujo rosto naturalmente ambíguo transmite todas as vastas sensações de seu personagem, um herói trágico na tradição de uma Cassandra grega. O suspense crescente, que Cronenberg manipula com extrema consciência, é construído com detalhes, nunca deixando de lado o drama inerente a uma existência como a de Johnny, eternamente na corda bamba entre o horror e a tragédia. E é também importante para tamanha precisão no suspense a trilha sonora discreta mas eficaz do veterano Michael Kamen, que jamais anuncia os momentos de maior tensão, preferindo, ao contrário, comentá-los conforme a ação vai se delineando diante dos olhos do espectador.
Uma das melhores adaptações de um livro de terror de Stephen King para as telas, "A hora da zona morta" se beneficia também do fato de saber terminar. Ao contrário de várias futuras transições da obra do escritor, que são estragadas por finais sem sentido ou forçados, o filme de David Cronenberg tem um desfecho climático, coerente e emocionante, valorizado pela atuação brilhante de Martin Sheen, que equilibra com inteligência a canastrice comum aos políticos demagogos com uma riqueza de nuances que deixa a audiência à espera de seu próximo movimento - que nunca é aquele esperado, o que dá ao filme sua sensação de imprevisibilidade que faz dele uma experiência ainda hoje bastante intrigante.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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Um comentário:
Eu adoro demais esse filme. Realmente uma das melhores adaptações de King.
http://filme-do-dia.blogspot.com.br/
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