O TURISTA ACIDENTAL (The accidental tourist, 1988, Warner Bros,
121min) Direção: Lawrence Kasdan. Roteiro: Lawrence Kasdan, Frank
Galati, romance de Anne Tyler. Fotografia: John Bailey. Montagem: Carol
Littleton. Música: John Williams. Figurino: Ruth Myers. Direção de
arte/cenários: Bo Welch, Cricket Rowland. Produção executiva: Phyllis
Carlyle, John Malkovich. Produção: Michael Grillo, Lawrence Kasdan,
Charles Okun. Elenco: William Hurt, Kathleen Turner, Geena Davis, Bill
Pullman, Amy Wright, David Ogden Stiers, Ed Begley Jr.. Estreia:
23/12/88
4 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Atriz Coadjuvante (Geena Davis), Roteiro Adaptado, Trilha Sonora Original
Vencedor do Oscar de Atriz Coadjuvante (Geena Davis)
A
expectativa era grande em torno do reencontro entre o cineasta Lawrence
Kasdan e a dupla de atores William Hurt e Kathleen Turner, afinal, eles
haviam incendiado as telas de cinema sete anos antes com o neo-noir
"Corpos ardentes" (81), que embora tenha fracassado nas bilheterias,
tornou-se referência no gênero thriller erótico pouco depois - chegando a
gerar inúmeras imitações, quase nunca tão boas quanto ele. Acontece que
tal expectativa acabou sendo o maior problema enfrentado por "O turista
acidental", drama familiar baseado no best-seller de Anne Tyler e que
foi o projeto que marcou a reunião do talentoso trio: misturar um livro
de sucesso, um cineasta competente, uma atriz em alta (Turner já havia
concorrido ao Oscar por "Peggy Sue, o passado à espera" (86)) e um ator
oscarizado (por "O beijo da mulher-aranha" (85)) só poderia dar coisa
boa, e ninguém esperava o contrário. Mas, apesar de todos os
ingredientes estarem disponíveis, o filme não obteve o resultado
esperado. Mesmo tendo concorrido ao Oscar de melhor filme do ano - em
uma indicação até hoje pouco compreensível - e ter sido premiado pela
Associação de Críticos de Nova York, o filme de Kasdan peca por ser um
drama irregular, que alterna momentos brilhantes com outros simplesmente
aborrecidos.
Apesar do nome de Turner aparecer no
cartaz com o mesmo destaque que Hurt - certamente uma estratégia de
marketing - é o ator, que emplacou uma sucessão de indicações ao Oscar
(em 85, 86 e 87) que carrega o filme nas costas, como o protagonista
absoluto da trama criada por Tyler. Ele interpreta Macon Leary, um
escritor de guias de viagem para executivos torturado pela morte
violenta do filho adolescente e que vê seu casamento aparentemente
estável com a bela Sarah (Kathleen Turner) acabar melancolicamente.
Vivendo seus dias sem maior entusiasmo - e voltando a conviver com sua
estranha família, com quem mantém uma relação quase distante - Macon tem
sua rotina alterada quando conhece Muriel Pritchett (Geena Davis), uma
jovem amalucada que trabalha no hotel para cães onde ele deixou seu
animal de estimação durante uma viagem. Os dois - ele retraído, tenso e
incapaz de lidar com os sentimentos em torno da perda do filho e ela
excêntrica, alegre e corajosamente criando seu filho pequeno sozinha -
acabam por formar um inusitado casal, que será ameaçado por suas
diferenças, pelas circunstâncias sociais e, pior ainda, pelo retorno de
Sarah, que resolve tentar uma nova chance para seu casamento.
A
boa ideia do roteiro de Kasdan e Frank Galati - indicados ao Oscar da
categoria - de ilustrar passagens dos livros de Leary (que faz sugestões
práticas aos leitores de como carregar pouca bagagem, por exemplo) com
momentos de sua vida é realmente interessante, fazendo um bem-vindo
contraponto entre o que é teoria e realidade. As metáforas do livro de
Tyler parecem intactas em sua transposição para o cinema e Kasdan é,
comprovadamente um roteirista de mão cheia, capaz de escrever diálogos
que soam naturais mesmo com personagens que beiram o surreal, como a
doidivanas Muriel, que Geena Davis interpreta com graça e propriedade
mesmo não tendo sido a primeira escolha para o papel - Jessica Lange,
Ellen Barkin e Laura Dern estavam à sua frente. Optando pela discrição
da atuação em contraste com o quase exagero das atitudes da personagem,
Davis (que no mesmo ano estava no elenco do blockbuster "Os fantasmas se
divertem") equilibra os dois pontos de Muriel a ponto de fazer com que o
público acredite que, por exemplo, ela é capaz de sair de seu país de
uma hora para outra apenas para encontrar o ex-namorado. Talvez tenha
sido essa sutileza da interpretação a responsável pelo Oscar de
coadjuvante que Davis papou de nomes mais fortes, como Sigourney Weaver,
Michelle Pfeiffer e Frances McDormand.
"O turista
acidental" é um filme americano de alma europeia. Seu drama, apesar de
devastador, não se revela em catárticas cenas lacrimosas e sim na
tristeza profundamente enraizada de Macon Leary, que prefere isolar-se
do mundo e das emoções a ter que enfrentá-las corajosamente. Lawrence
Kasdan não se permite nem ao menos explorar mais detalhadamente a origem
da tragédia do casal central, optando, ao invés disso, por flashes
rápidos do acontecido (mais como forma de situar a plateia do que para
buscar a comoção rasteira). Esses acertos, porém, esbarram em cenas
desnecessárias (como quase todas as que envolvem a família de Macon,
inclusive retratando o romance nascente entre sua irmã e seu chefe,
vivido por um ainda desconhecido Bill Pullman) que tiram o foco, a
energia e o ritmo do filme. Fosse mais econômico certamente ele teria
criado uma pequena obra-prima. Como está, seu filme é, longe de ruim,
apenas correto e sóbrio - e, considerando a explosão sensual de "Corpos
ardentes", a quase frieza de "O turista acidental" não deixa de ser um
interessante paradoxo que mostra sua versatilidade e competência.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
sexta-feira
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Um comentário:
Eu vi esse filme tem uns dois anos. E lendo o seu texto agora me toquei que não lembro de praticamente nada. Só sei que já vi.
Ou seja...
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