GLORIA
(Gloria, 2013, Fabula/Nephilim Producciones, 110min) Direção: Sebastián
Lelio. Roteiro: Sebastián Lelio, Gonzalo Maza. Fotografia: Benjamín
Echazarreta. Montagem: Sebastián Lelio, Soledad Salfate. Figurino:
Eduardo Castro. Direção de arte: Marcela Urivi. Produção executiva:
Andrea Carrasco Stuven, Juan Ignacio Correa, Mariane Hartard, Rocío
Jadue. Elenco: Luis Collar, Juan de Dios Larraín, Pablo Larraín. Elenco:
Paulina García, Sergio Hernández, Diego Fontecilla, Fabiola Zamora, Luz
Jiménez. Estreia: 10/02/13 (Festival de Berlim)
Gloria
é uma mulher de cinquenta e poucos anos, separada há mais de uma
década, mãe de dois filhos adultos, avó de um bebê e que mora sozinha em
um pequeno apartamento de Santiago de onde pode ouvir as crises de um
jovem vizinho com problemas psiquiátricos. Nos fins-de-semana, suas
noites são preenchidas por bailes da terceira idade, onde ela tenta
encontrar companhia e quem sabe um novo amor. Em uma dessas noitadas,
ela conhece Rodolfo, um homem também separado, com quem inicia um
promissor romance. Porém, o passado de seu novo amante não demora a
atrapalhar seus planos: incapaz de distanciar-se definitivamente da
esposa e das duas filhas, ele mostra-se não a solução para seus
problemas, e sim mais uma dificuldade a ser vencida na luta pela
felicidade e pela paz de espírito.
Com uma personagem
simples na descrição e complexa na vastidão de sentimentos -
demonstrados através de olhares melancólicos e de lágrimas que brotam
nos momentos mais impróprios - a chilena Paulina García conquistou os
eleitores do Festival de Berlim de 2013, de onde saiu-se vitoriosa como
melhor atriz. Nada mais justo. Sem apelar para histrionismos
previsíveis, García é o corpo e a alma de um filme cuja simplicidade
aparente esconde uma profusão de camadas emocionais que justificaram sua
escolha como representante oficial do Chile na disputa por uma
indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Mesmo tendo ficado de
fora da lista final, "Gloria" não deixou de tornar-se, aos poucos, um
dos filmes mais comentados do ano pelos fãs de cinema, principalmente
pela receptividade mais que positiva junto a diversos festivais
internacionais. Minimalista ao extremo - tanto em termos de roteiro
quanto de interpretação - o filme de Sebastián Lelio é daqueles que
demoram a conquistar (talvez seja necessário até mesmo mais de uma
sessão para que isso aconteça), mas o faz sem artifícios dramáticos. É a
vida como ela é, retratada com delicadeza e sobriedade.
Interpretada
com impressionante naturalidade por Paulina García - que não demonstra o
menor pudor em mostrar sua nudez em cenas de sexo que jamais passariam
pelo controle de qualidade hollywoodiano (leia-se sem filtros ou corpos
esculpidos à mão) - Gloria é uma mulher que se encontra em qualquer
supermercado ou fila de banco: discreta atrás de seus grandes óculos,
ela se desdobra para ser uma avó presente, faz ioga para agradar à filha
que está em vias de envolver-se com um namorado sueco, se incomoda com o
vizinho desequilibrado e, como um Tony Manero da terceira idade,
trabalha a semana inteira na expectativa de divertir-se nos bailes de
sábado. Não tem um corpo malhado e nem procura um príncipe encantado,
apenas um homem comum, que esteja a seu lado nos anos que lhe restam.
Gloria chora quando se emociona com uma canção - e a trilha sonora faz
questão de homenagear a música brasileira, com uma bela versão de "Águas
de março" - e chora quando ouve o email que o namorado da filha mandou,
dizendo que a ama. Gloria comete erros de julgamento e muitas vezes sua
carência a faz parecer uma adolescente. Gloria se sente traída, mas
sabe perdoar - assim como também reconhece a hora de ser boba e partir
para o contra-ataque. Gloria ri, chora, ama e odeia. Em uns dias perde e
em outros ganha. Mas sempre recomeça, porque a esperança é a última que
morre.
"Gloria" não é um filme para qualquer tipo de
público. Talvez muitos o considerem chato, sem história para contar e
com uma protagonista sem as qualidades heroicas que se espera de uma
personagem principal. Porém, é esse o objetivo de Sebastián Lelio e seu
filme: mostrar a rotina quase sem graça de uma mulher que busca a
felicidade mesmo quando parece que não há mais onde se procurar. Mesmo
que o filme em vários momentos dê inúmeras porradas na cabeça de sua
protagonista - e poucas pessoas teriam sua paciência em relação aos
problema que encontra em seu relacionamento com Rodolfo (Sergio
Hernández) - ela nunca deixa de lado a tenacidade e a crença em si mesma
e no amor. A cena final deixa tudo isso bem claro, e é impossível não
estar do lado de Gloria quando os créditos finais começam. Se você não
gostou da primeira vez, tente de novo: é aos poucos que tudo vai se
tornando belo e encantador.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
domingo
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