segunda-feira

DICK TRACY

DICK TRACY (Dick Tracy, 1990, Touchstone Pictures, 105min) Direção: Warren Beatty. Roteiro: Jim Cash, Jack Epps Jr., personagem criado por Chester Gould. Fotografia: Vittorio Storaro. Montagem: Richard Marks. Música: Danny Elfman. Canções: Stephen Sondheim. Figurino: Milena Canonero. Direção de arte/cenários: Richard Sylbert/Rick Simpson. Produção executiva: Art Linson, Floyd Mutrux, Barrie M. Osborne. Produção: Warren Beatty. Elenco: Warren Beatty, Al Pacino, Madonna, Glenne Headley, Charles Durning, Dustin Hoffman, William Forsythe, Mandy Patinkin, James Caan, Charlie Korsmo, Estelle Parsons, Kathy Bates. Estreia: 14/6/90

7 indicações ao Oscar: Ator Coadjuvante (Al Pacino), Fotografia, Figurino, Direção de Arte/Cenários, Canção ("Sooner or later"), Maquiagem, Som
Vencedor de 3 Oscar: Canção ("Sooner or later"), Direção de Arte/Cenários, Maquiagem 

Depois que "Batman", dirigido por Tim Burton e estrelado por Michael Keaton e Jack Nicholson tomou o mundo de assalto em 1989, surpreendendo até mesmo as mais altas e megalômanas expectativas da Warner, ninguém duvidava que outros filmes de super-heróis das histórias em quadrinhos surgissem no horizonte, pegando carona no sucesso do homem-morcego. E nem demorou muito até que uma produção caprichada, sob os auspícios da Disney e comandada por um dos mais confiáveis homens da indústria dominasse as atenções: Dick Tracy, o detetive de queixo quadrado criado por Chester Gould em 1931, chegou às telas em pleno verão americano de 1990, dirigido, produzido e estrelado por Warren Beatty, na companhia de nomes de peso, como Al Pacino e Madonna (com quem o astro esteve envolvido durante as filmagens, como era de seu feitio). Com um custo estimado de 46 milhões de dólares, o filme pode não ter repetido o êxito da obra de Burton, mas com uma renda superior a 100 milhões somente no mercado doméstico (EUA e Canadá), não decepcionou nem o estúdio - que queria encher os bolsos - nem o público - que buscava entretenimento puro e simples.

A bem da verdade, apesar de seu roteiro frouxo - que mistura vários vilões criados por Gould em uma única trama - "Dick Tracy" pode ser considerado um passo à frente do Batman de Burton, que só conseguiria equilíbrio entre visão pessoal e comercial com sua sequência, "Batman, o retorno" (92). A começar por sua estupenda direção de arte (merecidamente premiada com o Oscar), a visão de Beatty dos quadrinhos de Gold se aproxima genialmente do original, anos antes que "Sin City, a cidade do pecado" (05) tornasse tão tênue a fronteira entre o cinema e os comic books. Colorido ao ponto de quase ferir os olhos, fotografado com precisão pelo veterano Vittorio Storaro (que também chegou a concorrer à estatueta da Academia) e com uma galeria de tipos recriados com um preciosismo fascinante pela maquiagem de John Caglione Jr. - que deixa atores conhecidos como Al Pacino e Dustin Hoffman irreconhecíveis atrás da maquiagem - o visual do filme é, sem dúvida, seu maior e mais saboroso atrativo. Mesmo que Warren Beatty tenha preferido (acertadamente) deixar de lado em sua caracterização o queixo proeminente que é a marca de Tracy, todo o resto é absolutamente apaixonante, feito com o objetivo claro de seduzir a audiência pela visão. Uma pena, porém, que o roteiro, com dito anteriormente, deixe muito a desejar.


Dick Tracy, o protagonista vivido por Beatty com seu habitual ar blasé, é o detetive mais corajoso de uma cidade cada vez mais dominada pelos gângsteres, que, depois de um desentendimento mais violento do que o normal, passam a ser liderados por Big Boy Caprice (Al Pacino, nitidamente se divertindo aos montes em um papel atípico que lhe deu uma indicação ao Oscar de coadjuvante no mesmo ano em que ele merecia uma lembrança na categoria principal por "O poderoso chefão, parte 3").  Incorruptível, Tracy tenta de todas as maneiras acabar com a festa de Caprice, inclusive tentando cooptar para seu lado a sensual Breathless Mahoney (Madonna), principal atração do night-club utilizado pelos bandidos como quartel-general. A aproximação entre o detetive e Mahoney - cujo comportamento ambíguo ao mesmo tempo o repele e seduz - passa a incomodar sua eterna namorada, a fiel e dedicada Tess Trueheart (Glenne Headley) e até o pequeno Kid (Charlie Korsmo), um menino de rua que o admira e que tem intenções de ser adotado por ele. Não bastasse tudo isso, Tracy ainda é preso, vítima de uma armadilha criminosa, e a cidade passa a ser ameaçada por um misterioso bandido sem rosto.

A superficialidade da trama de "Dick Tracy" de certa forma combina com o tom de entretenimento ligeiro proposto por Warren Beatty e companhia, mas não deixa de ser um balde de água fria naqueles que procuram no filme algo mais do que um simples passatempo inócuo. Além de ter um começo um tanto confuso, o roteiro não desenvolve a contento nenhum personagem - nem mesmo seu protagonista - deixando a plateia órfã daqueles sentimentos tão procurados em um blockbuster: a identificação com o herói e a torcida pela derrota do vilão. Aqui, tanto o Tracy de Beatty soa quase apático a maior parte do tempo quanto o Big Boy de Pacino - apesar da performance inspirada do ator - arranca no máximo gargalhadas. Nem mesmo a identidade do misterioso criminoso sem rosto chega a causar alguma reação, talvez por sua previsibilidade. Sobra para o deleite do público, então, o visual acachapante, a curiosidade de ver Madonna como atriz (e, apesar de genial artista sobre os palcos ela não chega a convencer no papel de Mahoney) e as belas canções do veterano compositor da Broadway Stephen Sondheim - uma delas, a balada "Sooner or later" também chegou a ser premiada com o Oscar. Para um filme com tantas ambições, é pouco.

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