UM
SONHO DISTANTE (Far and away, 1992, Universal Pictures/Imagine
Entertainment, 140min) Direção: Ron Howard. Roteiro: Bob Dolman, estória
de Bob Dolman, Ron Howard. Fotografia: Mikael Salomon. Montagem: Daniel
Hanley, Michael Hill. Música: John Williams. Figurino: Joanna Johnston.
Direção de arte/cenários: Allan Cameron, Jack T. Collins/Richard
Goddard. Produção executiva: Todd Hallowell. Produção: Brian Grazer, Ron
Howard. Elenco: Tom Cruise, Nicole Kidman, Thomas Gibson, Robert
Prosky, Barbara Babcock, Colm Meaney, Brendan Gleeson. Estreia: 18/5/92
(Festival de Cannes)
Tudo está no lugar: a
fotografia espetacular, a trama que honra a superação de limites de
classe e possibilidades de ascensão social, a dupla romântica bela e
carismática, a reconstituição caprichada de época e o roteiro
equilibrado entre cenas dramáticas, cômicas e de ação - além do
orçamento nada desprezível (dentro dos padrões do início dos anos 90) de
60 milhões de dólares. Por que, então, "Um sonho distante", a ambição
de Ron Howard em criar um épico de grandes proporções, naufragou tão
solenemente nos EUA, a ponto de sequer ter conseguido o retorno de seu
investimento? Lançado com toda pompa e circunstância no Festival de
Cannes de 1992, o filme nem ao menos empolgou a crítica, os jurados do
festival ou os membros da Academia de Hollywood, passando em brancas
nuvens em todas as cerimônias de premiação do ano. Primeiro filme de Tom
Cruise e Nicole Kidman como um casal - eles já haviam contracenado
antes em "Dias de trovão" (90), mas ainda não eram casados - a história
de amor entre dois jovens irlandeses - diferentes como a água e o vinho -
em meio à busca pelo tão sonhado pedaço de chão na América do final do
século XVIII pode ser uma festa para os olhos, mas carece, para atingir
plenamente seus objetivos artísticos e comerciais, de personalidade.
Criado
em meio à indústria do entretenimento - quando criança ficou conhecido
como um dos atores da popular telessérie "Happy days" - o cineasta Ron
Howard sempre esteve ciente dos meandros do sistema e, por conseguinte,
das exigências do mercado. Tal característica o norteou, portanto, desde
seus primeiros passos atrás das câmeras e foi a responsável tanto pelo
sucesso de bilheteria de filmes como "Splash, uma sereia em minha vida"
(84) - primeiro grande êxito de Tom Hanks - e "O tiro que não saiu pela
culatra" (89) - delicado e carinhoso retrato da paternidade - como de
fracassos ambiciosos - "Willow, na terra da magia" (88), um projeto
pessoal que não encontrou seu público. Seguindo à risca a regra que
ensina que uma bilheteria polpuda só será possível se determinado filme
conquistar os quatro quadrantes - homens, mulheres, adultos e
adolescentes - Howard construiu uma obra que se esforça perceptivelmente
a atingí-los: há o romance emoldurado por belas paisagens para os
suspiros femininos, cenas de luta e ação para agradar àqueles sedentos
por adrenalina, um humor ingênuo (que quase nunca funciona, diga-se de
passagem) e até mesmo o maniqueísmo típico desse tipo de produção, que
coloca em lados muito bem definidos os mocinhos dos bandidos. No
entanto, nessa tentativa de abraçar o mundo, "Um sonho distante" acaba
falhando justamente pela previsibilidade.
A
trama de "Um sonho distante" se passa no final da década de 1890,
quando chegou à Irlanda a notícia - um tanto quanto incompleta em
relação aos fatos, mas ainda assim promissora - de que os EUA estavam
distribuindo terras aos imigrantes dispostos ao árduo trabalho de
cultivá-las. A possibilidade de uma nova vida imediatamente chama a
atenção do jovem Joseph Donnelly (Tom Cruise), que acaba de perder o
pai, não vê futuro em manter-se em sua terra natal e ambiciona tornar-se
dono de uma propriedade onde possa criar uma família. Seu caminho em
direção à sua terra prometida cruza-se com o de Shannon Christie (Nicole
Kidman), uma moça da alta sociedade que se recusa a cumprir as regras
pré-estabelecidas por sua classe social (e tampouco casar-se com o homem
escolhido para ela) e também deseja chegar à Oklahoma e estabelecer-se.
Passando-se por irmãos, eles chegam aos EUA e lutam para manter-se: ela
arruma emprego depenando galinhas e ele passa a ganhar dinheiro
envolvendo-se em lutas organizadas pelo aparentemente simpático Kelly
(Colm Meaney). Sem perceber que estão apaixonados um por outro, eles
terão que passar por grandes dificuldades financeiras e uma separação
traumática para notarem que dividem o mesmo sonho.
Não é
difícil gostar de "Um sonho distante", já que Ron Howard cuida
minuciosamente de cada detalhe para agradar a todos os tipos de
audiência. A fotografia grandiosa de Mikael Salomon, a música
grandiloquente de John Williams e os figurinos de Joanna Johnston estão
todos alinhados ao desejo do diretor em criar um filme inesquecível. Uma
pena, no entanto, que sua opção em tratá-lo como um produto "para a
família" - com o romance entre Cruise e Kidman e até mesmo as cenas mais
violentas amenizadas com esse propósito - tenha lhe tirado a
oportunidade de fazer o filme definitivo sobre um dos momentos
essenciais da história norte-americana - e do qual seus próprios
antepassados tomaram parte. É um filme visualmente belíssimo, mas frio e
sem empatia com a mesma audiência que queria tanto conquistar. Está
longe de ser uma bomba, mas Howard com certeza sai-se muito melhor
quando é intimista.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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