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MARIDOS E ESPOSAS

MARIDOS E ESPOSAS (Husbands and wives, 1992, TriStar Pictures, 103min) Direção e roteiro: Woody Allen. Fotografia: Carlo Di Palma. Montagem: Susan E. Morse. Figurino: Jeffrey Kurland. Direção de arte/cenários: Santo Loquasto/Susan Bode. Produção executiva: Charles H. Joffe, Jack Rollins. Produção: Robert Greenhut. Elenco: Woody Allen, Mia Farrow, Judy Davis, Sydney Pollack, Liam Neeson, Juliette Lewis, Ron Rifkin, Blythe Danner. Estreia: 14/9/92 (Festival de Toronto)

2 indicações ao Oscar: Atriz Coadjuvante (Judy Davis), Roteiro Original

Em 1992, o mundo do cinema foi pego de surpresa com um escândalo envolvendo um de seus mais discretos membros: o mesmo Woody Allen avesso à badalações e que preferia tocar jazz a frequentar as cerimônias de entrega do Oscar - estatueta que ele já havia ganho por "Noivo neurótico, noiva nervosa" (77) e "Hannah e suas irmãs" (86) - estampava as capas dos tabloides sensacionalistas graças ao controverso final de sua relação amorosa e profissional com a atriz Mia Farrow, que vinha desde 1980 e computava uma dúzia de filmes: aos 66 anos, Allen estava apaixonado por Soon-yi Previn, filha adotiva de Mia de apenas 21 anos. No rastro da polêmica, todo mundo se aproveitou: Farrow acusou o cineasta de pedofilia (fato que ainda em 2014 despertava acaloradas discussões), jornais venderam como nunca, os detratores de Allen encontraram finalmente um motivo para desprezá-lo (a despeito das afirmações de Farrow se mostrarem improcendentes com o passar do tempo) e a TriStar Pictures antecipou a estreia de "Maridos e esposas", comédia dramática que analisava os relacionamentos de dois casais de amigos - e que mostrava Woody se afastando de Mia por estar interessado em uma aluna décadas mais jovem - para lucrar em cima da polêmica. Por baixo de tanta gritaria, porém, o que pouca gente percebeu foi que, fofocas à parte, o filme era muito bom. Desde "Crimes e pecados" (89) o diretor/roteirista não encontrava um equilíbrio tão grande em drama, humor e insights sobre relações humanas.

Filmando em tom de documentário - câmera na mão, entrevistas diretas, cortes abruptos - "Maridos e esposas" é, na verdade, um Woody Allen típico, na forma e no conteúdo. Ele mesmo interpreta Gabe Roth, professor de literatura que acaba de escrever seu próprio livro e vive um relacionamento pacifico e quase tedioso com Judy (Mia Farrow), que está no segundo casamento. O filme começa quando eles recebem a visita de um casal de amigos, Jack (Sydney Pollack) e Sally (Judy Davis) que, para sua surpresa, anunciam sua separação. Tidos como um exemplo de relacionamento, Jack e Sally resolveram seguir caminhos diferentes na vida e tal fato cai como uma bomba na vida de Gabe e Judy, que lidam com a situação de maneiras opostas: enquanto Judy tenta servir de cupido entre Sally e Michael (Liam Neeson), um colega de trabalho pelo qual ela mesma está atraída, Gabe se envolve com Rain (Juliette Lewis), uma brilhante aluna com uma queda por homens com o triplo de sua idade.


Sob a luz do escândalo Soon-yi, "Maridos e esposas" foi dissecado exaustivamente pela mídia, pelo público e por qualquer pessoa que julgasse ter uma opinião sobre o caso. Não adiantou que fosse divulgado que o papel pensado para Mia Farrow fosse o de Sally e não o de Judy (uma passivo-agressiva neurastência e manipuladora): os conspiradores de plantão já afirmavam que Allen estava propositalmente dando à atriz um papel amargo e antipático. Não bastava que o final do filme contrariasse o final da história na vida real: todos achavam que o diretor estava justificando, em seu roteiro, as atitudes que tomara fora dos sets. Foram tantas teorias, tantos boatos transformados em fatos e opiniões pessoais tidas como verdades universais que o filme - enquanto produto cinematográfico - acabou ficando em segundo plano. Uma pena. Nem mesmo as duas indicações ao Oscar (roteiro e atriz coadjuvante) foram o suficiente para que fosse dada mais importância a ele. E isso que Judy Davis simplesmente arrasa na pele da insegura Sally: além de concorrer ao Oscar e ao Golden Globe, ela foi premiada pelos críticos de Los Angeles, pelo National Board of Review e pela National Society of Film Critics. Só a cena em que ela discute a relação com o ex-marido pelo telefone da casa do homem com quem está de saída para a ópera vale o filme todo.

À parte escândalos e teorias, "Maridos e esposas" é um Woody Allen da melhor safra. Inteligente, engraçado, perspicaz e realista, o roteiro nunca se deixa mergulhar na autocomplacência ou na crítica exagerada às relações, dando a todas elas uma dose de generosidade, independente de seu grau de neurose. Além do mais, é o ponto final de uma parceria que muito deu ao cinema americano nos anos 80. Uma chave de ouro que ainda será descoberta como um dos melhores filmes da década de 90.

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