SEIS
GRAUS DE SEPARAÇÃO (Six degrees of separation, 1993, MGM Productions,
112min) Direção: Fred Schepisi. Roteiro: John Guare, peça teatral de sua
autoria. Fotografia: Ian Baker. Montagem: Peter Honess. Música: Jerry
Goldsmith. Figurino: Juddiana Makovsky. Direção de arte/cenários: Dennis
Bradford/Gretchen Rau. Produção executiva: Ric Kidney. Produção: Arnon
Milchan, Fred Schepisi. Elenco: Donald Sutherland, Stockard Channing,
Will Smith, Ian McKellen, Mary Beth Hurt, Bruce Davison, Richard Masur,
Heather Graham, Anthony Michael Hall. Estreia: 08/12/93
Indicado ao Oscar de Melhor Atriz (Stockard Channing)
Em
1983, um jovem negro de 19 anos de idade chamado David Hampton penetrou
na alta sociedade de Manhattan e, se fazendo passar por filho do ator
Sidney Poitier, conseguiu ludibriar personalidades como Melanie
Griffith, Gary Sinise e Calvin Klein e gente da alta sociedade
nova-iorquina, como o reitor de uma faculdade de jornalismo e um famoso
urologista. Alegando ser amigo de seus filhos que estavam na
universidade, ter sido assaltado ou ter perdido a bagagem em voo de
avião, ele se hospedava nos apartamentos de suas vítimas e, uma vez
tendo-as conquistado, até conseguia que lhes emprestassem dinheiro.
Farsa descoberta, o rapaz foi preso e banido de Nova York - até morrer,
vítima de complicações relacionadas ao vírus da AIDS, em 2013. Sua
história - quase absurda demais para ser verdade - chegou aos ouvidos do
dramaturgo John Guare, que não resistiu à tentação de levá-la para os
palcos. A peça "Seis graus de separação" estreou em novembro de 1990,
foi indicada ao Tony de melhor espetáculo do ano e, pouco menos de três
anos depois, chegava também às telas de cinema, adaptada pelo próprio
Guare, dirigida por Fred Schepisi e estrelada pela mesma atriz que lhe
deu vida na Broadway, Stockard Channing, que acabou indicada ao Golden
Globe e ao Oscar por sua interpretação.
Mais conhecida
como a encrenqueira Rizzo de "Grease, nos tempos da brilhantina" (78),
Channing está brilhante no papel de Ouisa Kittredge, uma sofisticada e
quase fútil socialite nova-iorquina que trabalha, ao lado do marido,
Flan (Donald Sutherland) negociando valiosas obras de arte para
colecionadores que dispensam o intermédio de galerias. Com os três
filhos na universidade, eles vivem em um mundo de luxo e conforto -
ainda que também se utilizem dos privilégios da aparência social - cuja
rotina de jantares e festas é quebrado uma noite com a chegada em sua
casa de Paul (Will Smith em seu primeiro papel de destaque em
Hollywood), um jovem que, alegando ter sido assaltado em frente a seu
prédio, apresenta-se como amigo de seus filhos. Enquanto é auxiliado
pelo casal - e por um convidado sul-africano que está de passagem pela
cidade, o milionário Geoffrey Miller (Ian McKellen) - Paul conta a eles
sua história de vida, terminando por afirmar-lhes ser filho do primeiro
casamento de Poitier. Fascinados com a situação - e com a possibilidade
de fazerem parte de uma possível filmagem do musical "Cats" que está
presumivelmente sendo produzida pelo ator - os Kittredge se deixam
envolver com a lábia e a simpatia do rapaz, a ponto de convidá-lo a
passar a noite em sua casa. Depois que a noite acaba mal, porém, eles
chegam à conclusão de que Paul não é exatamente quem eles pensavam.
Em
um encontro com um casal de amigos, os também ricaços Kitty (Mary Beth
Hurt) e Larkin (Bruce Davison), os Kittredge ficam abismados quando
descobrem que o mesmo golpe foi aplicado em seus amigos e resolvem ir à
polícia. Para sua surpresa, o caso não é novo, e um médico da cidade,
Dr. Fine (Richard Masur) surge para comprovar a afirmação. Com um misto
de curiosidade/preocupação/senso de aventura, o grupo de "vítimas"
resolve investigar a fundo e tentar descobrir a origem de Paul, seus
objetivos em penetrar na alta sociedade e seu paradeiro. Para isso,
contam com a ajuda - a princípio contrafeita - dos filhos e de Trent
(Anthony Michael Hall), um antigo amigo dos jovens, que parece ter sido o
ponto de partida da farsa, que chega a um patamar ainda maior quando
ele ressurge espalhando por Manhattan que é um filho rejeitado de Flan
Kittredge.
Escrito com um sarcástico senso de humor
mergulhado em uma tocante melancolia e uma feroz crítica à futilidade da
refinada sociedade de Manhattan - e do mundo todo, de uma maneira ou
outra - "Seis graus de separação" consegue manter um equilíbrio perfeito
entre o humor sutil e o drama delicado, sem jamais pesar a mão para
nenhum lado. Ao narrar sua história como uma anedota inconsequente do
jet-set nova-iorquino (o que dá vazão a uma memorável explosão final de
Ouisa em um jantar chique), Guare enfatiza toda a diferença cultural que
afasta os bem-nascidos como os Kittredge dos renegados como Paul, que
anseiam desesperadamente por um mundo de luxo, arte, conforto e atenção.
Para isso é fundamental, portanto, a atuação madura de Will Smith,
brindando a plateia com um personagem que, à parte o carisma de sempre,
em nada lembra seus papéis posteriores. Com um misto de desamparo, ginga
e obsessão, ele constroi um Paul sempre surpreendente, que vai
revelando camada por camada conforme a trama se desenvolve - também é
notável o trabalho de edição de Peter Honess, que mantém a atenção do
público sempre constante.
"Seis graus de separação" é
um filme que cativa aos poucos, se revelando, em seu final, uma produção
muito mais inteligente e instigante do que parecia em seus primeiros
minutos. Uma pérola pouco conhecida capaz de conquistar o mais exigente
espectador.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
JADE
JADE (Jade, 1995, Paramount Pictures, 95min) Direção: William Friedkin. Roteiro: Joe Eszterhas. Fotografia: Andrzej Bartkowiak. Montagem...
-
EVIL: RAÍZES DO MAL (Ondskan, 2003, Moviola Film, 113min) Direção: Mikael Hafstrom. Roteiro: Hans Gunnarsson, Mikael Hafstrom, Klas Osterg...
-
NÃO FALE O MAL (Speak no evil, 2022, Profile Pictures/OAK Motion Pictures/Det Danske Filminstitut, 97min) Direção: Christian Tafdrup. Roteir...
-
ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA (Presumed innocent, 1990, Warner Bros, 127min) Direção: Alan J. Pakula. Roteiro: Frank Pierson, Alan J. Paku...
Nenhum comentário:
Postar um comentário