O
GUARDA-COSTAS (The bodyguard, 1992, Warner Bros, 129min) Direção: Mick
Jackson. Roteiro: Lawrence Kasdan. Fotografia: Andrew Dunn. Montagem:
Donn Cambern, Richard A. Harris. Música: Alan Silvestri. Figurino: Susan
Nininger. Direção de arte/cenários: Jeffrey Beecroft/Lisa Dean.
Produção: Kevin Costner, Lawrence Kasdan, Jim Wilson. Elenco: Kevin
Costner, Whitney Houston, Gary Kemp, Bill Cobbs, Ralph Waite, Michele
Lamar Richars. Estreia: 25/11/92
2 indicações ao Oscar: Melhor Canção ("I have nothing", "Run to you")
Primeiro,
na metade dos anos 70, o projeto que seria estrelado por Diana Ross e
Steve McQueen foi cancelado por ser considerado muito controverso (vale
lembrar que o racismo era uma chaga social ainda maior no período).
Poucos anos depois, ainda na mesma década, ele voltou à baila, novamente
com Ross cotada como estrela, mas dessa vez ao lado do ex-namorado Ryan
O'Neal - e novamente ficou só no papel, justamente porque as diferenças
entre os outrora amantes impediram que a coisa andasse. Foi preciso,
então, praticamente outros vinte anos para que finalmente "O
guarda-costas" visse a luz dos refletores. E, levando-se em consideração
o estouro de bilheteria - e o status de clássico kitsch que amealhou
com o passar do tempo, devido às inúmeras apresentações na televisão - o
filme que conta a história de amor entre um guarda-costas branco e uma
estrela da música pop negra (que vem a ser sua cliente) não poderia ter
estreado em melhor momento. Estrelado por um Kevin Costner no auge da
popularidade - ainda surfando na onda do prestígio acumulado pelos sete
Oscar de seu "Dança com lobos" (90) e pela polêmica do genial "JFK"
(91), de Oliver Stone - e pela cantora Whitney Houston - que estreava no
cinema no rastro de seu êxito nas paradas de sucesso - "O
guarda-costas" custou a bagatela de 25 milhões de dólares e arrecadou
mais de 120 milhões só no mercado doméstico (EUA e Canadá), além de ver
sua trilha sonora quebrar recordes de vendas, puxada pela
música-chiclete da década, "I will always love you", hit country que
Houston regravou especialmente para o filme e transformou em uma das
canções mais emblemáticas de sua carreira.
Houston -
que morreu precocemente, vítima de uma overdose em 2012 - não era uma
atriz de muitas nuances, mas era dona de uma beleza delicada e de um
carisma inegável, o que fez dela a escolha ideal para o papel da
protagonista do filme de Mick Jackson, que até então não apresentava
nada mais recomendável no currículo do que a comédia romântica "L.A.
Story", estrelada por Steve Martin em 1991. Marron, vivida por Houston
no filme, é uma cantora extremamente popular, linda, milionária e
talentosa que, em vias de também ser reconhecida como grande atriz ao
ser indicada ao Oscar, passa a ser ameaçada (via cartas anônimas e
bombas caseiras) de morte. Para protegê-la, é contratado Frank Farmer
(Kevin Costner), famoso como o melhor do ramo e por ter entre suas
regras não trabalhar com celebridades. O pagamento generoso, porém, faz
com que ele mude de ideia, mas logo ele percebe que terá muito trabalho
pela frente: não apenas a equipe da cantora não é exatamente simpática à
ideia de um estranho circulando e impondo ordens, mas a própria
estrela, subestimando o perigo que corre, o trata apenas como mais um
empregado. As coisas mudam, no entanto, quando ela se apaixona por ele, é
correspondida, e o criminoso começa a dar sinais de estar mais perto do
que se pensava.
O
roteiro de "O guarda-costas" - escrito pelo cineasta Lawrence Kasdan - é
repleto de clichês, mas eles desfilam pela tela banhados em um visual
tão caprichado que é difícil não se deixar conquistar. A mansão de
Marron - a mesma utilizada por Francis Ford Coppola na famosa cena da
cabeça de cavalo em "O poderoso chefão" (72) - é espetacular, assim como
as referências do cineasta aos clássicos "Metrópolis" (22), de Fritz
Lang (citado plasticamente no videoclipe "Queen of the night") e
"Yojimbo, o guarda-costas", de Akira Kurosawa (filme preferido do
personagem de Costner, que o assiste em companhia de sua
cliente/namorada). Tais momentos desviam a trama de sua previsibilidade e
até mostram o dedo de Kasdan, um roteirista/diretor que sempre
demonstrou carinho pelas tradições cinematográficas - haja visto sua
revisita ao western em "Silverado" e seu script para o vitorioso
"Caçadores da arca perdida" (81). Aqui ele equilibra o tom cerebral do
cinema policial dos anos 70 com referências à cultura popular da década
de 90, evitando tanto a violência excessiva quanto o erotismo que se
tornaria ingrediente obrigatório em filmes de suspense após o sucesso de
"Instinto selvagem" (92). O romance entre Farmer e Rachel beira o
puritanismo (a cena de amor entre eles é basicamente um beijo e um corte
para a manhã seguinte) e as sequências em que Frank precisa passar à
ação soam mais como uma justificativa para enquadrar o filme no gênero
policial do que uma necessidade orgânica do roteiro.
Apesar
dos pesares, porém, "O guarda-costas" é um dos filmes-ícone dos anos 90
e sobrevive incólume a quaisquer críticas e esnobismo por parte dos
cinéfilos mais intelectualoides. Suas constantes reprises na TV aberta
ainda conquistam audiência, a trilha sonora entoada por Whitney Houston
se mantém inesquecível e é difícil encontrar alguma pessoa que nunca
tenha o assistido ao menos uma vez. Um clássico moderno, a despeito de
suas falhas.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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