E
A VIDA CONTINUA (And the band played on, 1993, HBO Pictures/Spelling
Entertainment, 141min) Direção: Roger Spottiswoode. Roteiro: Arnold
Schulman, livro de Randy Shilts. Fotografia: Paul Elliott. Montagem:
Lois Freeman-Fox. Música: Carter Burwell. Figurino: Patti Callicott.
Direção de arte/cenários: Victoria Paul/Diana Allen Williams. Produção
executiva: Aaron Spelling, E. Duke Vincent. Produção: Sarah Pillsbury,
Midge Sanford. Elenco: Matthew Modine, Ian McKellen, Glenne Headly,
Richard Gere, Anjelica Huston, Alan Alda, Charles Martin Smith, Phil
Collins, Nathalie Baye, Richard Jenkins, Saul Rubinek, Donal Logue,
Patrick Bauchau, Steve Martin, Swoozie Kurtz, Tchéky Karyo. Estreia:
11/9/93
Em 1989, o filme "Meu querido companheiro",
de Norman René, já mostrava, através de um grupo de amigos de Nova
York, o estrago que o vírus da AIDS fez junto à comunidade homossexual
americana em seus primórdios, quando ainda era conhecido apenas como o
"câncer gay". Com enfoque humanista e emocional, o filme deu a Bruce
Davison uma indicação ao Oscar de coadjuvante e tornou-se o primeiro
filme ianque a tratar abertamente do assunto - não por acaso, era uma
produção independente, já que os grandes estúdios de Hollywood evitavam o
tema como se fosse uma doença contagiosa (ops...).Foi somente com
"Filadélfia", de Jonathan Demme, que os grandes orçamentos e astros
bancáveis começaram a demonstrar um interesse que acabou, com o tempo,
tornando-se o caminho fácil para o Oscar - que o diga Tom Hanks, Matthew
McConaughey e Jared Leto. No mesmo ano em que o filme de Demme foi
lançado, porém, outra produção fora dos limites do cinema comercial
americano tocou no tema, de forma séria, pontual e quase didática.
Baseado em um livro de Randy Shilts que narrava a odisseia dos médicos
americanos e franceses em entender e combater uma doença cuja origem e
desenvolvimento ainda eram grandes incógnitas, "E a vida continua"
estreou no canal a cabo HBO em setembro de 1993 apresentando um elenco
de rostos conhecidos e um capricho que, anos depois, se tornaria a marca
registrada da emissora.
Com a longa duração de 141
minutos - sendo que os finais são dedicados a uma montagem com imagens
de vítimas famosas (ou não) da doença sob a voz de Elton John cantando a
bela "The last song" - "E a vida continua" evita o sentimentalismo ao
tratar do assunto de forma quase jornalística, centrando seu foco em Don
Francis (Matthew Modine, indicado ao Golden Globe por seu desempenho),
um jovem médico infectologista que tenta, junto à equipe do Centro de
Controle de Doenças de Atlanta, desvendar o que está causando a morte de
dezenas de homossexuais masculinos, que perdem a imunidade
repentinamente e morrem devido a doenças oportunistas. Sem o apoio do
governo - que parece não se importar com o fato de que uma epidemia está
em vias de acontecer - e nem mesmo dos próprios gays (que se recusam a
mudar seu estilo de vida por considerarem tal ato um retrocesso a seus
direitos civis), o grupo de médicos parte em busca da ajuda de
profissionais franceses, como o competente Luc Montagnier (Patrick
Buchau) - que entra em confronto direto com outro americano, Robert
Gallo (Alan Alda), o primeiro médico a descobrir um retrovírus e que
pretende ficar com o mérito de também ter descoberto o vírus da nova
doença.
Mostrando
passo a passo a evolução tanto da epidemia quanto das conquistas
médicas, o filme de Roger Spottiswoode - diretor burocrático mas pouco
ousado que já havia tentado arrancar graça de Sylvester Stallone em
"Pare, senão mamãe atira!", em 1992 - segue no rumo oposto a "Meu
querido companheiro", preferindo dedicar sua atenção na batalha
incansável travada pela Medicina do que em suas vítimas e nos efeitos
arrasadores da epidemia junto à população homossexual. Enquanto Francis
luta por financiamento, por ajuda do governo e pelo apoio do próprio
grupo de risco, o filme desenha sem maior ênfase o destino de alguns
pacientes, como o comissário de voo promíscuo (Jeffret Nordling) que
ajuda os médicos a encontrarem uma trilha de contaminação, o jovem
símbolo da doença (Donal Logue) que luta para chamar a atenção da
população e o coreógrafo famoso (Richard Gere) que se descobre doente e
faz uma generosa doação para as pesquisas. A presença de Gere no elenco,
aliás, é um dos pontos de destaque do filme. Um dos mais populares
astros da década de 90 - vindo de sucessos como "Justiça cega" e "Uma
linda mulher" - Gere entrou no projeto por acreditar em sua importância
social e sua atitude resultou em uma corrida desenfreada de atores
querendo fazer parte da empreitada, mesmo que em papéis pequenos.
Foi
assim que Anjelica Huston, Steve Martin, Ian McKellen e Alan Alda
embarcaram em "E a vida continua", um filme de importância política e
social inegável e que lançou luz a um tema até então considerado
impróprio e desagradável para o grande público - e para a presidência do
país, uma vez que foi preciso mais de uma década desde a primeira morte
para que Ronald Reagan fizesse sua primeira menção à epidemia. De lá
pra cá o cinema e a televisão vem explorando o assunto em produções de
qualidades variadas - inclusive a mesma HBO lançou, em 2014, o
sensacional "The normal heart", que dramatiza o mesmo período histórico
sob um ponto de vista mais dramático e menos técnico - mas isso não lhe
tira o mérito do pioneirismo.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
segunda-feira
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