SHORT CUTS, CENAS DA VIDA (Short cuts, 1993, Fine Line
Features/Spelling Films International, 187min) Direção: Robert Altman.
Roteiro: Robert Altman, Frank Barhydt, contos de Raymond Carver.
Fotografia: Walt Lloyd. Montagem: Geraldine Peroni. Música: Mark Isham.
Figurino: John Hay. Direção de arte/cenários: Stephen Altman/Susan J.
Emshwiller. Produção executiva: Scott Bushnell. Produção: Cary Brokaw.
Elenco: Andie MacDowell, Bruce Davison, Jack Lemmon, Julianne Moore,
Matthew Modine, Anne Archer, Fred Ward, Jennifer Jason-Leigh, Chris
Penn, Lily Taylor, Robert Downey Jr., Madeleine Stowe, Tim Robbins, Lily
Tomlin, Tom Waits, Frances McDormand, Peter Gallagher, Annie Ross, Lori
Singer, Lyle Lovett, Buck Henry, Huey Lewis. Estreia: 05/9/93 (Festival
de Veneza)
Indicado ao Oscar de Diretor (Robert Altman)
Desde que recuperou o prestígio e as boas graças da indústria e do
público com "O jogador" (92), que lhe deu a Palma de Ouro em Cannes e
uma indicação ao Oscar de diretor, Robert Altman entrou em uma boa fase
sem precedentes em sua carreira. Qualquer projeto que levasse sua
assinatura no começo da década era garantia de entusiasmadas
expectativas por parte da indústria e dos fãs - situação que acabou com
"Pret-a-porter" (95), malfadada tentativa de desvendar os bastidores do
mundo da moda que fracassou nas bilheterias e desagradou a gregos e
troianos. Antes disso, porém, Altman encantou a crítica com um ambicioso
projeto que reunia contos de Raymond Carver em um único filme,
misturando seu próprio estilo de cinema (uma tênue linha narrativa
abarcando inúmeros personagens independentes entre si) com a prosa
minimalista e frequentemente poetica do escritor norte-americano. "Short
cuts, cenas da vida" resultou em uma produção longa (três horas de
duração que soam exatamente como três horas de duração), irregular e
calcada basicamente em seu vasto elenco de ótimos atores, porque, apesar
de todos os aplausos, é um filme cansativo e que vai do nada pra lugar
nenhum.
É fácil de entender porque os atores gostam
de trabalhar com Altman: é perceptível que o veterano cineasta lhes dá a
liberdade de improvisar e criar em cima de personagens com uma carga
humana muitas vezes inexistente no cinema comercial americano. É também
fácil de compreender o entusiasmo com que a crítica muitas vezes recebe
seus trabalhos: diretores autorais, com uma visão especial do mundo e da
própria indústria são raros, especialmente depois que a era dos
visionários deu lugar à era dos efeitos especiais e dos lucros
milionários. Porém, para gostar de Robert Altman é preciso, mais do que
tudo, gostar do seu estilo peculiar de cinema. Quem procura filmes com
tramas bem amarradas ou narrativas estruturadas do modo convencional
corre o sério risco de decepcionar-se com a obra do diretor, normalmente
avessa a tais regras. Altman é o típico caso de amar ou odiar. E talvez
"Short cuts" seja um de seus mais radicais exercícios.
Justamente
por não ter uma espinha dorsal rígida - os detratores diriam que falta
uma trama central - "Short cuts" depende muito da boa-vontade do
espectador em seguir todas as histórias contadas pelo roteiro, que se
cruzam sutil e aleatoriamente pelos subúrbios de uma Los Angeles
ameaçada tanto por fenômenos naturais (terremotos, enxames de moscas)
quanto pelos problemas de relacionamento entre famílias e amigos. Se
existe um incidente que dá o empurrão inicial em tudo pode-se dizer que é
o atropelamento do pequeno Casey (Zane Cassidy), filho da dona-de-casa
Ann (Andie MacDowell) e do comentarista de telejornal Howard (Bruce
Davison) - cujo pai, Paul (Jack Lemmon dando olé em cena), abandonou a
família anos antes e retorna como se nada tivesse acontecido. Quem
atropela o menino e o manda para o hospital sem que saiba das
consequências do seu ato é a garçonete Doreen Piggot (Lily Tomlin), que,
ironicamente, é casada com um chofer particular que luta contra o
alcoolismo, Earl (Tom Waits). Sua filha, Honey (Lily Taylor) é casada
com um aprendiz de maquiador de cinema, Bill (Robert Downey Jr.), que é o
melhor amigo de Jerry Kaiser (Chris Penn), casado com Lois (Jennifer
Jason Leigh), que trabalha como atendente em uma empresa de sexo por
telefone.
E assim por diante. Duas dezenas de
personagens desfilam pela tela, repletos de problemas cotidianos e
dramas pessoais que se equilibram entre o banal e o surreal. Há
casamentos em crises, ex-maridos truculentos, pescadores que continuam
seu passatempo a despeito do cadáver de uma jovem a poucos metros,
traições extraconjugais e até mesmo uma Julianne Moore em nu frontal em
uma cena que espanta pela naturalidade: enquanto discute com o marido a
respeito de um possível adultério passado, ela - totalmente nua da
cintura pra baixo - Moore passa a ferro a roupa amarrotada por acidente.
Assim é o cinema de Altman: banal, simples, direto. Enquanto uma jovem
violoncelista sofre com a tristeza do mundo e um padeiro se revolta com o
que considera um desrespeito a seu trabalho, a terra treme, a vida
segue e raivas enrustidas explodem com violência. Nem sempre o trabalho
do cineasta é palatável. Mas quem gosta de fugir do feijão-com-arroz do
cinemão americano pode se interessar bastante.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
terça-feira
SHORT CUTS, CENAS DA VIDA
Assinar:
Postar comentários (Atom)
JADE
JADE (Jade, 1995, Paramount Pictures, 95min) Direção: William Friedkin. Roteiro: Joe Eszterhas. Fotografia: Andrzej Bartkowiak. Montagem...
-
EVIL: RAÍZES DO MAL (Ondskan, 2003, Moviola Film, 113min) Direção: Mikael Hafstrom. Roteiro: Hans Gunnarsson, Mikael Hafstrom, Klas Osterg...
-
NÃO FALE O MAL (Speak no evil, 2022, Profile Pictures/OAK Motion Pictures/Det Danske Filminstitut, 97min) Direção: Christian Tafdrup. Roteir...
-
ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA (Presumed innocent, 1990, Warner Bros, 127min) Direção: Alan J. Pakula. Roteiro: Frank Pierson, Alan J. Paku...
Nenhum comentário:
Postar um comentário