AQUI É O MEU LUGAR (This must be the place, 2011, Indigo Film/Lucky Red/Medusa Film, 118min) Direção: Paolo Sorrrentino. Roteiro: Paolo Sorrentino, Umberto Contarello. Fotografia: Luca Bigazzi. Montagem: Cristiano Travaglioli. Música: David Byrne, Will Oldham. Figurino: Karen Patch. Direção de arte/cenários: Stefania Cella. Produção executiva: Ron Bozman, Viola Prestieri. Produção: Francesca Cima, Nicola Giuliano, Andrea Occhipinti, Mario Spedaletti. Elenco: Sean Penn, Frances McDormand, Judd Hirsch, Harry Dean Stanton, Olwen Fouéré, Ewe Hewson, Shea Whigham. Estreia: 20/5/11 (Festival de Cannes)
A
estranheza que o rosto maquiado e envelhecido de Sean Penn causa quando
se vê o cartaz de "Aqui é o meu lugar" não deixa de ser um aperitivo
para o que vem pela frente quando se arrisca a conferir a obra dirigida
pelo italiano Paolo Sorrentino. Melancólico e um tanto perdido em suas
intenções, o roteiro do filme é exatamente como seu protagonista, um
homem em busca de raízes, tentando sobreviver em um mundo hostil ao qual
ele parece não mais pertencer. Interpretado por um ator menos capaz, o
roqueiro ultrapassado Cheyenne seria nada mais do que irremediavelmente
patético. Na pele do sempre grande Penn ele também é muito triste e,
apesar de bizarro e deslocado no tempo e no espaço, bastante humano.
Cheyenne
é um roqueiro das antigas, ao estilo Robert "The Cure" Smith, que,
depois de aposentado, tem um dia-a-dia modorrento e tedioso em Dublin,
ao lado da esposa carinhosa (Frances McDormand) e de vizinhos que não
conseguem deixar de estranhar seu visual atípico. Tendo também que lidar
com a culpa que carrega devido ao suicídio de uma dupla de adolescentes fãs de sua
música, Cheyenne vaga pelo mundo sem maiores arroubos de felicidade ou
entusiasmo. A pasmaceira de sua rotina só é quebrada inesperadamente,
porém, quando ele fica sabendo que seu pai está à beira da morte em Nova
York. Afastado do convívio com o pai há três décadas, ele resolve
tentar uma reconciliação, mas, chegando tarde demais, descobre que a
única maneira de conseguir atingir seu objetivo é vingar as humilhações
sofridas por seu progenitor quando prisioneiro de um campo de
concentração durante a II Guerra. Ignorante até então da extensão do
sofrimento de seu pai, o cantor resolve então vingar-se do carrasco
nazista responsável e parte em busca de revanche. No meio do caminho,
como sempre acontece em road movies, ele passa a questionar suas
próprias raízes, convicções e objetivos, principalmente quando encontra,
durante o trajeto, pessoas capazes de fazê-lo enxergar coisas até então
invisíveis para seus olhos um tanto egocêntricos.
Resumido
dessa forma, "Aqui é o meu lugar" soa como a mais reles autoajuda. No
entanto, Sorrentino - diretor do elogiado "Il Divo", indicado ao Oscar de filme estrangeiro - consegue escapar muitas vezes dos clichês que
assolam o gênero, equilibrando com inteligência uma boa dose de ironia e toneladas de uma indisfarçável melancolia, revelada tanto no olhar distante do protagonista em boa parte da narrativa quanto nos detalhes visuais que a câmera, discreta mas sempre atenta, vai colecionando em seu caminho, repleto de figuras excêntricas e, a seu modo, fascinantes. Dono de um estilo seco de direção, Sorrentino mantém-se sempre distante do piegas, mas quando aceita tocar de leve na emoção é arrasador - a sequência em que Cheyenne toca a canção-título do filme com o filho pequeno de uma nova amiga é de encher o coração, especialmente quando se sabe que ela é a neta do homem a quem ele procura e que um de seus maiores arrependimentos na vida é não ter sido pai. A cena é rápida, mas acrescenta uma camada de humanidade ao protagonista que acaba sendo de importância crucial no desfecho da história.
Como sempre ocorre em filmes do estilo, o
destino é menos importante do que a jornada - ainda que o embate final
entre Cheyenne e o nazista seja bem resolvido e forte. É no desenrolar
da viagem de Cheyenne que o filme encontra sua razão de ser, assim como o
protagonista também encontra nesse mergulho em si mesmo a força para
deixar o passado pra trás e encarar o futuro do qual tanto fugia. E é
Sean Penn, do alto de seu talento avassalador, que dá sentido a tudo.
Com mais uma atuação corajosa em sua carreira - com um tom de voz delicado, batom nos lábios, esmalte nas unhas e um penteado bizarro - Penn arrasta a plateia
para sua angústia, para oferecer-lhe, ao final da projeção, uma
experiência bem mais enriquecedora do que se poderia pressupor. É
estranho, é bizarro, é triste. Mas é, também, imperdível, nem que seja
para se confirmar o que já se sabe há um bom tempo: Penn é um dos
melhores atores americanos em atividade.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
JADE
JADE (Jade, 1995, Paramount Pictures, 95min) Direção: William Friedkin. Roteiro: Joe Eszterhas. Fotografia: Andrzej Bartkowiak. Montagem...
-
EVIL: RAÍZES DO MAL (Ondskan, 2003, Moviola Film, 113min) Direção: Mikael Hafstrom. Roteiro: Hans Gunnarsson, Mikael Hafstrom, Klas Osterg...
-
NÃO FALE O MAL (Speak no evil, 2022, Profile Pictures/OAK Motion Pictures/Det Danske Filminstitut, 97min) Direção: Christian Tafdrup. Roteir...
-
ACIMA DE QUALQUER SUSPEITA (Presumed innocent, 1990, Warner Bros, 127min) Direção: Alan J. Pakula. Roteiro: Frank Pierson, Alan J. Paku...
Nenhum comentário:
Postar um comentário